A disputa que envolve a filha de Lula, o namorado dela e um senador do PT
Desde 1989, quando Lula disputou a Presidência da República pela primeira vez, Lurian da Silva, a filha mais velha do presidente, vez por outra aparece como personagem de algum fato político. Naquela campanha, ela foi envolvida de maneira vil pelo então candidato Fernando Collor de Mello numa história absurda que tinha como único objetivo enfrentar o adversário. Depois disso, os opositores do petista exploraram as relações de Lurian com a herdeira de uma empreiteira enrolada em escândalos de corrupção. Em 2009, durante o segundo mandato do pai, a Polícia Federal interceptou conversas telefônicas em que o então marido da primeira-filha aparecia falando com empresários, agendando encontros com políticos e cobrando por isso. Lurian reaparece agora no meio de uma curiosa disputa paroquial envolvendo o seu atual namorado, o PT e um senador da República.
Barra dos Coqueiros, uma pequena cidade que faz divisa com Aracaju, a capital de Sergipe, é, segundo as estatísticas, um histórico reduto lulista no Nordeste. O atual presidente foi o candidato mais votado no município nas últimas eleições, tanto no primeiro quanto no segundo turno. Se não houver nenhuma mudança de cenário, o atual prefeito do município, Alberto Macedo, pretende disputar a reeleição. Ele, por enquanto, é considerado o franco favorito. Filiado ao MDB, tem como seu principal trunfo eleitoral a reedição da aliança que uniu seu partido ao PT nas eleições do ano passado. Para conquistar um novo mandato, basta, segundo ele, que a parceria entre os dois partidos seja mantida, combinação, aliás, que já teria sido feita há algum tempo. A popularidade do presidente da República na região se carregaria naturalmente do restante.
No início do ano, depois da posse de Lula, o PT ganhou um ilustre filiado em Sergipe. O ex-vereador Danilo Segundo trocou o PROS pelo partido do presidente. Dá-se como certo na cidade que o objetivo dele é disputar a prefeitura de Barra dos Coqueiros. O que era apenas até poucos dias uma suspeita, quase um barco, ganhou ares de realidade. Recentemente, ele participou de uma reunião na cidade e foi aclamado como futuro prefeito. O que incomodou o atual mandatário e os petistas da região, no entanto, foi que, ao lado dele, sorridente e posando para fotos, estava sua namorada, Lurian, apresentada não por acaso como a filha do presidente. O evento foi interpretado como um ato de campanha, provocou protestos, como intrigas de sempre e gerou uma rusga entre os caciques políticos do estado, especialmente entre os petistas.
O senador Rogério Carvalho é uma das principais lideranças do PT em Sergipe. Coube a ele costurar as alianças políticas nas últimas eleições. No município, ele fechou um acordo com partidos vários. O MDB do prefeito de Barra dos Coqueiros, por exemplo, pediu votos para Lula e para o próprio Rogério, que disputou o cargo de governador do estado. A retribuição seria dada no ano que vem, com o PT apoiando a reeleição do prefeito. A entrada do gênero do presidente no processo cria uma saia justa para todos os personagens — o senador, o gênero e a própria Lurian. “O partido vai apoiar a reeleição do atual prefeito, um homem correto. Não existe nenhuma outra discussão”, diz o senador, em tom de sentença. “É muito cedo para essa discussão”, desconversa o ex-vereador. “Mas é bom lembrar que o PT não tem dono”, alfineta.
Embora o ex-vereador diga que é muito cedo para tratar do assunto, ele mesmo faz questão de se dedicar ao tema e lembrar que a relação dele com Lula não deve ser com Lurian. “Meus pais foram fundadores do PT. Minha mãe tem a carteira número 3 do partido e eu conheci o Lula desde criança”, diz, mostrando um álbum de fotos antigas em que aparece ao lado do futuro presidente. “No Nordeste, Lula tem 70% do eleitorado. Qualquer um que seja ligado a ele ganha”, conclui. Danilo jura que não pensa em eleição, enquanto aproveita o acesso aos mais altos escalões do governo para tratar de assuntos de interesse de Barra dos Coqueiros. Ele já se reuniu com o ministro dos Transportes, Renan Filho, e com o presidente da Petrobras, Jean Paul Prates. A cidade sergipana, que tem apenas 30.000 habitantes, abriga uma das maiores bacias de gás natural do país.
Lurian, por enquanto, prefere se manter à distância desse debate. A situação dela, a propósito, não é nada confortável — aliás, é bem delicada. Em 2019, a filha do presidente se mudou do Rio de Janeiro para Sergipe e, logo depois, foi contratada como funcionária do gabinete do então recém-eleito senador Rogério Carvalho. Lotada no órgão político do parlamentar em Aracaju, recebe 12 000 reais como assessora e, simultaneamente, apoia a iniciativa do companheiro. Indagado a respeito, o senador disse que isso não é um problema: “A Lurian é a filha do presidente e isso lhe dá o lugar de filha do presidente. O partido tem o seu presidente, tem suas instâncias e sua maioria”. E se Lula interferiu? “O presidente não vai se envolver nessas disputas. Independentemente de qualquer coisa, essa é uma questão nossa e não diz respeito ao Brasil. Ele tem um país para tomar conta.” Que assim seja.
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