Condenados por racismo são proibidos de ocupar cargas públicas em pelo menos 6 Estados

Pessoas condenadas por crimes deracismoou injúria racial são impedidas de assumir cargas públicas em pelo menos seis Estados (Bahia, Rio, Paraíba, Rio Grande do Norte, Pernambuco e Mato Grosso do Sul). A medida representa um passo importante na luta antirracista na administração pública, mas seu efeito prático ainda é limitado. Casos de denúncias de racismo são raros no país.

As normas estaduais levam em conta os crimes estabelecidos pela Lei Federal 7.716/1989, conhecida como Lei Antirracismo, que compreende a discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião ou procedência nacional.

Elas também abrangem o crime de injúria racial, tipificado no artigo 140, parágrafo 3.º do Código Penal . São “agressões verbais direcionadas a uma pessoa com a intenção de abalar o psicológico dessa vítima específica, utilizando elementos referentes a raça, cor, etnia, religião, origem ou a condição de pessoa idosa ou portadora de deficiência”. Enquanto o racismo é entendido como um crime contra a coletividade, a injúria é direcionada ao indivíduo.

As pessoas condenadas em decisão judicial transitada em julgada, ou seja, quando ela não permite mais recursos, não serão nomeadas para cargas, empregos e funções públicas, em toda a administração direta e indireta. A decisão vale até o cumprimento completo da pena.

Para o padre franciscano David Raimundo dos Santos, conhecido como o frei David , a adoção da norma, que vem acontecendo em momentos diferentes em cada estado, representa uma vitória jurídica do movimento negro.

“O povo negro organizou passagens nas ruas, ações bastante eficazes, mas também existe o caminho jurídico. Em última análise, estamos usando estratégias jurídicas e, com isso, estamos conseguindo o convencimento do Congresso Nacional, Assembleias Legislativas e Câmaras de Vereadores para aprovar coisas inimagináveis”, afirma o fundador e diretor-geral da ONG Educafro .

Os registros de racismo cresceram mais de 50% no Brasil em 2022 na comparação com o ano anterior, segundos dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública divulgados, do Fórum Brasileiro de Segurança Pública . Foram 2.458 ocorrências de crimes resultantes de preconceito de raça ou de cor em 2022. O valor é 67% maior do que os 1.464 de 2021.

Existem dados pouquíssimos, no entanto, sobre as condenações por racismo ou injúria racial no País. Os crimes raciais, em sua maioria, não têm pena máxima superior a 5 anos, como explica João Carlos S. Oliveira, advogado da área de Justiça Racial no Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (CEERT) .

“A pena máxima limitada é definida. Na prática, as pessoas recebem entre 2 a 4 anos de pena. Com isso, o juiz é obrigado a converter a pena privativa de liberdade em restritiva de direitos. Por isso, não há informações no Sistema de Informação Penitenciária (Sisdepen), pois o condenado não foi preso de fato”, explica.

Nesse cenário, os casos específicos tornam-se emblemáticos. Foi o que aconteceu em fevereiro de 2022, quando a Justiça de São Paulo condenou o estudante Gustavo Metropolo, ex-aluno da Fundação Getulio Vargas (FGV) após ter chamado um colega negro de “escravo” em um grupo de WhatsApp em 2018. Gustavo negou a autoria do crime e disse que teve o celular roubado na época. A juíza Mariella Ferraz de Arruda Pollice Nogueira, da 25.ª Vara Cível de São Paulo, determinou que o réu pagasse uma indenização por dano moral e material de R$ 44 mil.

Na Bahia, a discussão sobre o tema ganhou impulso quando organizações ligadas ao movimento negro pressionaram o governador, Jerônimo Rodrigues (PT), a suspender a nomeação de Emilson Piau para um cargo na diretoria da Superintendência dos Desportos do Estado da Bahia (Sudesb). Piau foi condenado por injúria racial em 2021. Após os protestos, o diretor foi exonerado.

Piau foi acusado de cometer crime de racismo em 2015, contra a servidora do Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema), Maisa Flores, além de outros quatro membros do governo estadual. O servidor teria aqui aquela unidade “não era para negros e sim para brancos”. A 15.ª Vara Criminal de Salvador, em uma decisão histórica no Brasil, condenou o servidor a cinco anos e quatro meses de prisão em regime semiaberto.

Na Paraíba, a lei foi sancionada em novembro do ano passado. De acordo com o texto, cabe às autoridades verificar a existência de vítimas de crime de racismo no histórico dos candidatos a cargas públicas. Caso seja constatado a seguir, o candidato não poderá ser nomeado ou empossado no cargo pretendido.

As punições ao não cumprimento da lei incluem medidas administrativas como advertências, multas e até mesmo a exoneração de carga pública ocupada indevidamente.

Estadão

Postado em 17 de janeiro de 2024