Deputado gasta R$ 240 mil em compra de cartões e envelopes

Em um mês, Alex Manente (Cidadania-SP) usou mais da metade da cota parlamentar de 2022 em uma gráfica.

O deputado Alex Manente (Cidadania-SP) gastou R$ 240 mil de verba da Câmara com a compra de milhares de envelopes, cartões de visita, papéis timbrados, além de 170 mil boletins informativos. O valor está entre as maiores despesas desse tipo feitas no ano passado entre todos os deputados. Apesar de incluir 10 mil envelopes, o parlamentar gastou R$ 37,47 com serviços postais até janeiro, o que pode indicar que eles não foram enviados. Procurado na sexta-feira, Manente não havia respondido até a noite de ontem.

A despesa coloca Manente no topo do ranking dos reembolsos mais altos pagos em um único serviço pela Casa na categoria “Manutenção de escritório de apoio” e em segundo lugar em gastos com “Divulgação de atividade parlamentar”. Ele gastou mais da metade (56,7%) de sua cota parlamentar prevista para o ano de 2022 em apenas duas notas fiscais emitidas por uma única gráfica no dia 27 de dezembro, a um mês do término do mandato.

Com o dinheiro da cota parlamentar, os deputados podem custear despesas com aluguel de escritório, passagens aéreas, alimentação, aluguel de carro, combustível, material de escritório, entre outras.

O primeiro pedido de reembolso é de R$ 73,4 mil. Manente disse ter comprado 10 mil envelopes ofício timbrados, 5 mil envelopes saco timbrados, 15 mil cartões de visitas laminados, 3 mil pastas canguru timbradas e 50 mil unidades de papel timbrado tamanho A4.

Essa é a nota mais alta apresentada na categoria por um deputado no ano passado. O valor é 2,5 vezes maior do que a segunda maior nota, enviada pelo deputado Daniel Trzeciak (PSDB-RS).

BOLETINS. A segunda nota fiscal apresentada por Manente informa a compra, no mesmo dia 27 de dezembro, de 170 mil boletins informativos sobre a atividade do parlamentar ao custo de R$ 166,6 mil. É o valor mais alto solicitado por um deputado na categoria “Divulgação de atividade parlamentar” no mês de dezembro.

As notas foram emitidas pela Lanagraf Serviços Gráficos, gráfica localizada em São Bernardo do Campo, município em que Manente é cotado para concorrer à prefeitura na eleição de 2024. No endereço que consta na nota fiscal funciona a Adaprint Artes Gráficas, empresa registrada como filial da Lanagraf, dos mesmos donos.

Partido Eleito no ano passado para o 3º mandato, Manente é líder do Cidadania na Casa e tesoureiro da legenda

As duas notas estão anexadas a uma declaração assinada de que o deputado transferiu os valores previamente à gráfica.

O Estadão ligou no escritório de Brasília do deputado e questionou se haveria boletins informativos para divulgação do mandato e foi informado de que seria necessário procurar o escritório de São Bernardo. A sede paulista não soube dizer se haveria informes disponíveis e repassou para a área de comunicação que, por sua vez, não respondeu sobre os 170 mil boletins informativos.

A reportagem procurou Manente e sua assessoria de imprensa na sexta-feira e questionou como foram usados os envelopes comprados e o destino dos boletins. A equipe do deputado confirmou o recebimento das perguntas, mas não havia respondido até a noite de ontem. No sábado, Manente disse não ter recebido a demanda e, portanto, não haveria tempo para esclarecer. Os sócios da Lanagraf foram contatados por telefone e mensagem, mas não responderam.

INFLUENTE. Eleito no ano passado para o seu terceiro mandato, Manente é líder do Cidadania na Câmara e tesoureiro do partido. O deputado é um dos homens mais próximos do presidente da Casa, Arthur Lira (PP-AL). A aliança garantiu a ele indicar milhões do orçamento secreto – relevado pelo Estadão – no governo Jair Bolsonaro (PL).

Manente é pré-candidato à prefeitura de São Bernardo, no ABC Paulista, nas eleições do ano que vem. O nome dele já aparece em sondagens.

PARECER. O deputado ainda teve um pedido de reembolso questionado pela Câmara, desta vez na categoria “Consultas, pesquisas e trabalhos técnicos”. A nota de R$ 28,5 mil foi emitida em 15 de fevereiro, sob a justificativa de que os serviços foram prestados em dezembro de 2022 e pagos no dia 29 daquele mês.

Após a recusa da Câmara, Manente apresentou um relatório assinado pela banca de advogados Kawamura, Calhado e Vilela, na qual os advogados afirmam que elaboraram para o Cidadania estudos jurídicos “sobre as necessidades de ampliação de gastos do governo fora do orçamento de 2023”. A Casa, então, aceitou fazer o pagamento no valor integral solicitado.

Na justificativa, os advogados dizem ter elaborado “pareceres sobre a alocação dos recursos das emendas de relator-geral e elaboração de projetos para correção do teto de gastos”.

O escritório que atestou ter elaborado os documentos funciona no mesmo prédio comercial do escritório de Manente em São Bernardo. Na página na internet, não informa expertise na área de orçamento público. As especialidades são “contratos, contencioso civil, direito do consumidor, direito empresarial, direito financeiro e bancário, família e sucessões, direito eleitoral e Anvisa”.

Os recursos para o reembolso pelos pareceres saíram da cota da liderança do Cidadania na Câmara, mas o pagamento por consultoria é atípico. Até dezembro, a verba havia sido utilizada basicamente com alimentação.

O Estadão pediu ao deputado cópia dos pareceres, mas não houve resposta. Também questionou o advogado Thiago Vilela, que integra o escritório contratado. Ele pediu para que o contato fosse feito com o sócio Rodrigo Kawamura, que não respondeu.

Autor: GUSTAVO QUEIROZ

O Estado de S. Paulo

Postado em 29 de maio de 2023