Deputados questionam viabilidade de programa que pretende ofertar passagens aéreas a R$ 200.
Deputados da oposição ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) têm dúvidas quanto à execução do programa Voa, Brasil, anunciado pelo ministro de Portos e Aeroportos, Márcio França, na última semana. O projeto pretende viabilizar passagens aéreas a R$ 200 por trecho para aposentados, pensionistas, estudantes que utilizam o Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies) e servidores públicos que ganham até R$ 6,8 mil.
Parlamentares ouvidos pelo R7 questionam a fonte de financiamento, os detalhes da proposta, a participação da União nos gastos, o impacto no preço das passagens, a opção pelo programa em detrimento de incentivos ao setor de aviação e dizem que o projeto tem caráter populista.
Márcio França anunciou o Voa, Brasil durante uma entrevista, sem consultar a Casa Civil, o que gerou mal-estar no governo federal. Lula teve de chamar uma reunião ministerial e deu uma “bronca” nos titulares das pastas. O presidente reafirmou que qualquer proposta, independentemente da área, deve ter o aval do Palácio do Planalto.
A reportagem questionou o Ministério de Portos e Aeroportos acerca do formato da iniciativa, mas a pasta não apresentou detalhes. “O programa está sendo desenvolvido pela Secretaria Nacional de Aviação Civil (SAC), que está em contato permanente com as companhias aéreas e ministérios competentes para a construção da proposta. Tão logo seja formulado, será apresentado para apreciação da Casa Civil e da Presidência da República. Por ora, são as informações disponíveis. Tão logo houver novidades, daremos ampla divulgação”, informou, em nota, a pasta.
Setor
Até o momento, o setor aéreo tem se mostrado favorável à proposta. A Associação Brasileira das Empresas Aéreas (Abear) informou que fará parte do grupo de trabalho montado pelo governo e que tem realizado debates sobre as “possíveis soluções para o crescimento sustentável do número de passageiros e destinos atendidos”.
Em comunicado, a Gol disse que o setor está se recuperando da maior crise da história, e políticas públicas, como a proposta pelo ministro, são “muito bem-vindas”. A Latam afirma que o projeto requer um trabalho conjunto entre o governo, a sociedade e a indústria da aviação civil.
Inviabilidade
Para o deputado federal Paulo Alexandre Barbosa (PSDB-SP), presidente da Frente Parlamentar de Portos e Aeroportos, o programa tem de ser formatado a partir do interesse público.
“Evidentemente que o governo federal tem de ser o grande aglutinador, envolvendo o setor privado, os bancos e os demais interessados. Os desafios são muitos, mas temos uma série de alternativas para isso ocorrer. Mas, lembrando, [o programa] precisa ser bem modelado, bem formatado”, afirma.
Para Kim Kataguiri (União Brasil-SP), o programa é “absurdo”. “Foi desautorizado pelo próprio governo por ser inviável. Não tem análise de impacto financeiro, não tem fonte de financiamento e não tem viabilidade”, critica.
Adriana Ventura (Novo-SP) teme que os passageiros não contemplados pelo programa tenham de pagar mais pelas viagens. “O ministro se precipitou, parece mais um programa criado no ‘achômetro’. Não há mágica: ou o governo subsidia com recurso do Orçamento ou usa artificialmente a Caixa e o Banco do Brasil para pagar a diferença. Obviamente, os bancos públicos vão ter prejuízo. Em ambos os casos, o governo vai criar uma reserva de mercado”, diz a parlamentar.
Opinião pública
Para a deputada, o interesse real do programa não é incentivar o setor. “Se o governo quisesse de verdade expandir a aviação no Brasil e baixar o preço das passagens, reduziria as regulamentações e as obrigações do setor que aumentam os custos de operação, e aumentaria a competição, reduzindo as barreiras legais e regulatórias para a entrada de novas companhias aéreas no mercado. Os empreendedores do setor precisam de estabilidade e segurança jurídica, não da imprevisibilidade populista”, afirma.
A deputada Rosana Valle (PL-SP) chama o programa de “Bolsa Avião”. “Parece, a princípio, bom, mas temos de ver se é exequível. Tinha ficado a impressão de que o governo daria subsídio, mas, não, serão as companhias aéreas. As empresas teriam como fiscalizar quantas passagens cada pessoa vai comprar? Não teria de ser o governo fiscalizando? Pelo que parece, seria um programa para as companhias aéreas. Nesse caso, onde o governo federal entra? Não consigo entender como seria exequível, porque não está claro”, aponta. A parlamentar questiona, ainda, a inclusão de outros grupos na lista de beneficiários.
E as pessoas com deficiência, não poderão fazer parte? E, se o indivíduo não é funcionário público mas ganha menos que R$ 6,8 mil, não pode participar? Por que apenas essas categorias? Parece, por enquanto, uma proposta meramente populista
DEPUTADA FEDERAL ROSANA VALLE, DO PL-SP
Programa
Apesar de o ministério não ter detalhado o projeto, França citou possíveis formatações.
Inicialmente, o governo federal não deve fornecer nenhum tipo de ajuda financeira ao setor. A ideia é comprar os assentos ociosos nas aeronaves para oferecer os bilhetes durante períodos de menor procura, de fevereiro a junho e de agosto a novembro.
O programa deve funcionar como uma espécie de crédito consignado. Nesse sentido, os bancos estatais, como a Caixa Econômica Federal e o Banco do Brasil, seriam uma alternativa para operar o projeto.
Assim, essas instituições ofereceriam o financiamento da compra dos bilhetes aéreos. As empresas, então, ficariam encarregadas de abrir mais espaços. Um grupo de trabalho foi montado para avaliar a viabilidade das medidas. A ideia do ministro é apresentar o programa formatado até o fim do primeiro semestre.
R7