Efeitos do clima em escolas brasileiras demandam mudanças urgentes, alerta Unicef

As enchentes no Rio Grande do Sul, a seca na região amazônica e outros eventos climáticos no Brasil afetaram ao menos 1,1 milhão de estudantes em 2024, segundo dados da Unicef (Fundo das Nações Unidas para Infância).

Ao R7, o especialista em clima e meio ambiente da organização Danilo Moura entende que o Brasil precisa adaptar as estratégias climáticas para garantir o melhor funcionamento e andamento de serviços públicos essenciais, como escolas, em crises ambientais.

“O clima mudou, e as estratégias para garantir segurança e funcionamento de equipamentos essenciais, como escolas, precisam mudar junto. Mesmo que a gente cumpra todos os compromissos internacionais que o Brasil assumiu e que outros países assumiram, a gente tem décadas pela frente, e eventos extremos vão se tornar mais frequentes e intensos. Você precisa ter políticas climáticas que reconheçam esse cenário e que preparem os serviços públicos essenciais para lidar com esse clima alterado”, disse.

O especialista cita que deve haver uma melhora na infraestrutura das escolas, atualização de protocolos e o desenvolvimento de um sistema educacional flexível o suficiente para manter jovens vinculados ao ensino.

No cenário global, ao menos 242 milhões de estudantes, em 85 países, sofreram impactos na vida escolar por eventos climáticos extremos, incluindo ondas de calor, ciclones tropicais, tempestades, inundações e secas. De acordo com o relatório, o Sul da Ásia foi a região mais prejudicada, com 128 milhões de estudantes afetados, enquanto na Ásia Oriental e no Pacífico o número chegou a 50 milhões.

“Globalmente, os sistemas educativos já estavam falhando com milhões de crianças. A falta de professores qualificados, as salas de aula sobrelotadas e as diferenças na qualidade e no acesso à educação têm criado, há muito tempo, uma crise de aprendizagem que os riscos climáticos estão exacerbando”, diz o Unicef.

Moura aponta ainda que, normalmente, as mudanças climáticas reforçam todas as estruturas de desigualdade já existentes. “São as pessoas menos responsáveis pela crise, como crianças e adolescentes, que são mais afetadas. Da mesma forma, quando você olha globalmente, são os países menos responsáveis pela crise climática que são mais impactados”, completou.

Segundo o porta-voz do Unicef, isso ocorre pelo fato de os países mais pobres terem menos recursos para se adaptar e proteger dos impactos climáticos. O estudo mostra que quase 74% dos estudantes afetados no ano passado estavam em países de rendimento baixo e médio-baixo. Entretanto, também foram registrados impactos em outras nações, como Itália e Espanha, afetadas por chuvas torrenciais e inundações.

Estados Unidos deixam o Acordo de Paris
O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, assinou um decreto para retirada do país do Acordo de Paris, tratado internacional que determina que os países envolvidos invistam em medidas de combate à mudança climática, reduzindo a emissão de gases de efeito estufa para manter o aquecimento global abaixo dos 1,5ºC.

Para Moura, a saída do país do acordo preocupa, principalmente por ser a maior economia mundial e pela alta emissão de gases de efeito estufa. “A ausência dos Estados Unidos cria um desafio para o regime climático global e obviamente cria um desafio para qualquer tentativa de movimento global para acelerar a transição energética”, disse.

Apesar disso, o especialista explica que aspectos derivados de tecnologias sustentáveis vão continuar em uso no país, mesmo ele estando fora do tratado. Por questões econômicas e políticas, é possível que a energia solar e eólica continuem crescendo nos EUA, por serem fontes mais baratas de energia.

“O sistema fica fragilizado, mas o processo de enfrentamento às mudanças climáticas não vai parar e não pode parar. Ele tem outras forças que vão empurrá-lo para frente, como já ocorreu no passado”, concluiu.

Ano mais quente
O ano de 2024 foi o mais quente registrado no país desde 1961, segundo o Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia). A média das temperaturas ficou em 25,02°C, sendo 0,79°C acima da média histórica de 1991/2020.

“Após análise dos desvios de temperaturas médias anuais do Brasil desde 1961 a 2024, o Inmet verificou uma tendência de aumento estatisticamente significativo das temperaturas ao longo dos anos, que pode estar associada à mudança no clima em decorrência da elevação da temperatura global e mudanças ambientais locais”, apontou o instituto.

De acordo com o serviço europeu de mudança do clima Copernicus, a temperatura média global do planeta no ano passado ultrapassou pela primeira vez a marca de 1,5°C em relação aos níveis pré-industriais. Segundo a instituição, a temperatura média global ficou 1,6°C mais quente se comparada ao período de 1850-1900.

Prejuízos por seca
Por 24 anos, a estiagem e a seca foram os desastres climatológicos que mais afetaram e causaram prejuízos no Brasil. Entre 2000 e 2023, os fenômenos geraram danos de ao menos R$ 359 bilhões no setor privado e de R$ 32 bilhões na área pública, totalizando R$ 391 bilhões, além de atingir 110 milhões de brasileiros, segundo um levantamento feito pela Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil.

Segundo os números, o prejuízo anual pela falta de chuva é estimado de R$ 16 bilhões. Rio Grande do Sul, Ceará, Mato Grosso, Bahia e Paraíba estão entre os estados mais afetados.

O levantamento mostra que, no setor privado, a agricultura foi a área com maiores prejuízos, chegando a R$ 258 bilhões no período. Ainda no agronegócio, a pecuária também registrou danos consideráveis, com R$ 84 bilhões. No Brasil, o setor representa aproximadamente 25% do PIB (Produto Interno Bruto) — a soma de todos os bens e serviços finais produzidos pelo país.

Em relação ao prejuízo público, o abastecimento de água foi o mais afetado, registrando um rombo de R$ 30 bilhões, o equivalente a 94,44% de todo o dano do governo. Em alguns anos, o levantamento não incluiu informações de todos os estados. Dessa forma, podem existir danos que não foram calculados.

R7

Postado em 24 de janeiro de 2025