Em meio a debate nacional, MPRN reforça operações contra crimes cibernéticos infantis

Postado em 19 de agosto de 2025

Dezessete operações, 25 mandados de busca e apreensão e 9 prisões em flagrante em um período de 4 anos no Rio Grande do Norte. Esse é o balanço em números da Operação Arcanjos, projeto desenvolvido pelo Ministério Público do Rio Grande do Norte (MPRN) no combate a crimes cibernéticos relacionados ao abuso de crianças e adolescentes, alcançando 12 municípios potiguares.

O debate sobre a adultização de crianças e adolescentes ganhou força no Brasil nas últimas semanas, após a repercussão de falas do influenciador Felca sobre o tema e, sobretudo, com a prisão do paraibano Hytalo Santos, em São Paulo. O criador de conteúdo, que produzia vídeos com adolescentes, é investigado por suposta exploração da imagem de menores com fins de monetização. O caso reacendeu alertas sobre os riscos da exposição precoce de crianças nas redes sociais e o papel da internet na difusão de conteúdos que podem configurar crimes de abuso sexual infantil.

Somente entre janeiro e julho de 2025, foram deflagradas quatro operações no estado, que resultaram em uma prisão em flagrante. Os números refletem tanto o crescimento da vigilância quanto a intensificação da circulação desse tipo de material na rede mundial de computadores.

O desafio das investigações
Segundo a promotora Tatianne Brito, do MPRN, a criação do projeto Arcanjos surgiu da necessidade de padronizar técnicas de investigação e aperfeiçoar o trabalho diante da complexidade crescente dos crimes virtuais envolvendo menores.

“Esses casos exigem metodologia, treinamento contínuo e adaptação constante, porque a tecnologia evolui muito rapidamente. Cada operação é única, mas a experiência acumulada serve para fortalecer novas investigações e aprimorar provas. É um trabalho que, além de repressivo, também tem um viés pedagógico, já que as práticas são difundidas entre diferentes órgãos de segurança”, explica a promotora.

Tatianne lembra que, apenas em 2022, houve um aumento de 82% no volume de materiais de abuso sexual infantil identificados globalmente em comparação a 2021. “E esse número é apenas a ponta do iceberg. A circulação ocorre em ambientes visíveis e também em camadas ocultas da internet, o que dificulta a contabilização real do problema”, alerta.

O MPRN reforça ainda a necessidade de chamar os conteúdos pelo termo correto: material de abuso sexual infantil. “Não é pornografia infantil, porque criança não faz pornografia. Trata-se de crime e de violência sexual”, pontua a promotora.

Além da repressão policial, a prevenção é apontada como essencial para reduzir riscos. O MPRN mantém disponível em seu perfil oficial no Instagram uma cartilha de orientação a pais e responsáveis. O material traz dicas sobre como identificar comportamentos suspeitos e acompanhar a rotina digital dos filhos.

“Antigamente, os pais se preocupavam com os perigos nas ruas. Hoje, o risco está dentro de casa, na palma da mão das crianças. Muitos abusadores utilizam jogos e redes sociais para se aproximar das vítimas. Estar próximo, acompanhar com quem a criança conversa e restringir o acesso a perfis privados são atitudes básicas de proteção”, reforça Tatianne Brito.

A promotora alerta também para a exposição excessiva em perfis abertos. “Muitos pais postam vídeos dos filhos em contas públicas, de olho na monetização. Mas isso pode transformar aquele conteúdo em material de exploração, consumido e compartilhado por criminosos.”

Impactos psicológicos da adultização
O fenômeno da adultização, quando crianças e adolescentes passam a reproduzir comportamentos, roupas e atitudes associadas ao universo adulto, é amplificado pelas redes sociais. Para a psicóloga Tatiana Assunção, as consequências podem ser devastadoras para o desenvolvimento emocional e cognitivo.

“Crianças expostas precocemente a padrões irreais de beleza e sexualidade tendem a desenvolver distorções da autoimagem. Elas podem sentir vergonha do próprio corpo, alimentar comparações constantes e fragilizar a identidade. Isso compromete relações interpessoais e pode levar a transtornos como depressão, ansiedade, distúrbios alimentares e até alterações de personalidade”, explica.

Segundo Tatiana, a sensação de ser vista apenas como objeto — comum em situações de exploração — mina a autoestima e torna crianças e adolescentes mais vulneráveis a novas violências. “Estamos diante de uma sociedade que, contra todas as evidências científicas, estimula a perda precoce da infância. Isso é um retrocesso histórico e cultural que precisa ser enfrentado.”

Um problema de todos
A repressão policial, a atuação do Ministério Público e o apoio de entidades nacionais são fundamentais, mas especialistas reforçam que o combate à exploração sexual infantil passa também pela consciência da sociedade.

“Os algoritmos favorecem conteúdos que geram engajamento e lucro. Quando pais e responsáveis expõem filhos em busca de visibilidade, muitas vezes sem perceber, contribuem para um ciclo de exploração. É preciso mudar essa lógica e colocar a proteção da infância acima de qualquer curtida”, conclui a psicóloga Tatiana Assunção.

Com operações em andamento e campanhas educativas, o Rio Grande do Norte mostra que tem buscado enfrentar o problema. Mas, diante do avanço dos crimes virtuais e da velocidade das transformações tecnológicas, o alerta é claro: a proteção das crianças no espaço digital depende do esforço conjunto de autoridades, famílias e sociedade civil.

Canais de denúncia
Casos suspeitos de exploração sexual infantil, seja presencial ou no ambiente digital, podem ser denunciados de forma anônima. No Rio Grande do Norte, os principais canais de atendimento são:

Disque 100 (nacional)
Disque 127 do MPRN
WhatsApp do GAECO/MPRN: (84) 98863-4585
E-mail: [email protected]
Conselho Tutelar
Polícia Civil
Safernet Brasil: www.safernet.org.br