Empresário diz à Justiça que ex-capitão Adriano da Nóbrega é dono de 300 imóveis em Rio das Pedras.

O empresário Eduardo Vinicius Giraldes Silva afirmou em depoimento à 1ª Vara Especializada em Organização Criminosa que o ex-capitão do Bope e miliciano Adriano Magalhães da Nóbrega possuía cerca de 300 imóveis em Rio das Pedras, na Zona Oeste do Rio. Adriano, apontado pelo Ministério Público do Rio (MPRJ) como dono da milícia da região, foi morto em fevereiro de 2020, em um sítio no interior da Bahia, em suposto confronto com policiais militares.

Giraldes que chegou a viver em união estável com Júlia Emília Mello Lotufo, viúva de Adriano, testemunhou em defesa dela no ano passado na Justiça. Procurado pelo GLOBO, o empresário disse que já se separou dela e que o contrato de união estável, no qual havia cláusula de comunhão total de bens, foi desfeito judicialmente.

Desvinculei-me disso. Já me trouxe muita dor de cabeça — disse ele.

Júlia é ré num processo que tramita na 1ª Vara Especializada em Organização Criminosa por lavagem de dinheiro e organização criminosa. Após a morte de Adriano, ela foi apontada pelo MPRJ como herdeira do espólio de negócios ilícitos do miliciano. Giraldes, que se casou com ela oito meses depois do assassinato do ex-capitão, disse à Justiça que Júlia não ficou com qualquer bem do miliciano:

— Eu falo isso sempre. É 100%. Realmente, a gente sabe, porque ela me disse, que ele (Adriano) tinha imóveis em Rio das Pedras, 200 e pouco, 300 imóveis, que ela não tem nem recebe o aluguel de um imóvel. Não ficou com um apartamento, um carro, uma bicicleta. Para não dizer que ela não ficou com nada, vou dizer que ela ficou com um cachorro que era deles e um cavalo, que eu também nunca vi. Inclusive, a baia dele sou eu que pago — afirmou o ex-companheiro de Júlia, que, com seu depoimento, confirmou as investigações do MPRJ durante a Operação Intocáveis 1, que denunciou Adriano em janeiro de 2019.

Segundo a denúncia do Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do MPRJ, Júlia é considerada peça-chave para se entender os negócios ilícitos de Adriano com a contravenção e a política. Os promotores afirmaram que o miliciano era chefe da milícia de Rio das Pedras e da Muzema e comandava um grupo de matadores de aluguel, denominado Escritório do Crime.

Como nada foi encontrado nos 13 celulares e sete chips apreendidos com Adriano, quando ele foi morto, Júlia, que se encontrava com o marido em seus esconderijos, ganhou importância. Após a morte do miliciano, ela foi alvo da Operação Gárgula, desencadeada em 29 de março de 2021. Ela e mais oito integrantes da quadrilha foram denunciados pelo Gaeco por crimes de associação criminosa, agiotagem e lavagem de dinheiro proveniente do espólio do miliciano.

O processo foi desmembrado e Júlia passou a responder em separado dos demais réus. Ao contrário deles, nunca foi presa, apesar de ter a prisão preventiva decretada. Ficou foragida até conseguir um habeas corpus no Superior Tribunal de Justiça (STJ), que lhe concedeu prisão domiciliar, além do uso de tornozeleira eletrônica.

De junho de 2021 até outubro do ano passado, a Polícia Civil, por conta própria e sem a anuência da Justiça, permitiu que três equipes da tropa de elite da corporação, a Coordenadoria de Recursos Especiais (Core), montassem vigilância e fizessem suas escoltas até o fórum, a pretexto de que Júlia corria risco de vida. Na época, havia a possibilidade de uma delação premiada, mas o Gaeco ao ouvi-la entendeu que havia inconsistências no seu relato. Meses depois, a proteção foi retirada por decisão judicial.

Giraldes prestou depoimento como testemunha de defesa de Júlia. O empresário disse ter se apaixonado por ela dois meses após Júlia se tornar viúva. Ele afirmou que paga as despesas dela, da filha e da sogra. O casal oficializou a união estável, em regime de comunhão total de bens, no cartório do 4º Ofício de Notas, no Recreio dos Bandeirantes, em outubro de 2020, ou seja, oito meses após Adriano ser morto no município de Esplanada, na Bahia, em suposto confronto com a polícia baiana.

Proibição de deixar o país

Atualmente, por decisão da 1ª Vara Especializada em Organização Criminosa, a viúva de Adriano não usa mais tornozeleira, nem está em prisão domiciliar. Mas está proibida de deixar o país; seu passaporte está confiscado pela Justiça. O desejo de Giraldes, contou ele no depoimento, era ir para Portugal, onde tem seu ramo de negócios: exportação de azeite para o Brasil. No entanto, seu relacionamento com Júlia teria mudado sua vida.

— Eu tinha programado a minha vida para ir morar em Portugal, porque a fábrica estava ficando pronta, apesar de ter me apaixonado por (ela) ser uma menina nova, bonita, legal, e me deu muito suporte emocional, devido à minha separação conturbada. Eu falei para ela: “Júlia, eu gostei, eu me apaixonei, mas a minha vida é completamente fora daqui”. Foi quando o relacionamento ficou mais firme e mais sério. Ela falou que iria comigo morar em Portugal — relatou Giraldes, antes de se separar de Júlia.

O empresário reforçou que ela não tem envolvimento com a lavagem de dinheiro de Adriano, mas o Gaeco sustenta o oposto. Na denúncia do MPRJ, há uma planilha financeira com cálculos dos negócios ilícitos do miliciano, feita três meses após a morte do ex-PM. A contabilidade apareceu numa conversa por aplicativo de mensagem entre Júlia e o primeiro ex-marido, o policial militar Rodrigo Bittencourt, antes do relacionamento com Adriano, também réu no processo.

O GLOBO

Postado em 15 de março de 2023