Futuro do sistema previdenciário estadual é discutido em audiência pública na ALRN

Postado em 17 de outubro de 2025

O Legislativo Potiguar promoveu audiência pública, na tarde desta quinta-feira (16), para discutir a situação previdenciária do Estado, com foco na busca de investimentos técnicos e estruturais no Instituto de Previdência dos Servidores Estaduais do RN (IPERN). O debate foi proposto pelo mandato do deputado estadual Nelter Queiroz (PSDB) e contou com a participação de representantes do Governo do Estado, IPERN, Procuradoria-geral do Estado, entidades sindicais e dos próprios servidores ativos e inativos.

“A situação da previdência é muito importante para todos. É preciso investimento técnico e estrutural no IPERN. E aqui nesta audiência nós vamos dar voz a todos, para que façam uma explanação real do nosso sistema, e a gente possa encontrar uma solução justa e coletiva”, afirmou o propositor da audiência.

Em seguida, o presidente do instituto, Nereu Linhares, iniciou seu pronunciamento dizendo que a situação do IPERN é dramática, do ponto de vista financeiro, estrutural e atuarial.

“A situação do sistema previdenciário do RN é de conhecimento público e notório. O IPERN é um órgão que foi criado há mais de 60 anos e nunca teve uma função de previdência realmente. Por isso – e outras questões, hoje o seu déficit financeiro (que é o valor que precisa ser aportado para completar a folha de aposentadorias e pensões) é de mais de R$ 150 milhões por mês. Além disso, também há um déficit atuarial de aproximadamente R$ 54 bilhões”, divulgou.

Nereu Linhares fez um resgate histórico, desde a criação do IPERN, apontando os principais motivos que levaram a entidade à atual problemática, frisando que “o déficit não foi constituído no Governo Fátima Bezerra”.

“Desde a sua criação, em 1962, o IPERN foi criado como um instituto de previdência, que deveria cobrir aposentadoria e pensão. Mas a legislação, na verdade, não incluiu aportes para aposentadorias. A regulamentação previa apenas pensão, auxílio-natalidade, auxílio-funeral e auxílio-reclusão. E isso significa que, até 2005, quando houve a aprovação da Lei Complementar 308 incluindo finalmente as aposentadorias, nenhum servidor do Estado do RN – de nenhum órgão ou Poder – havia contribuído um centavo sequer para a nossa previdência. Mesmo assim, o IPERN paga hoje as aposentadorias de todos os poderes”, detalhou.

O presidente do órgão relatou, na sequência, que a mesma lei criou ainda os chamados “benefícios assistenciais”, os quais, segundo Linhares, “são incompatíveis com o sistema previdenciário”.

“Previdência é, grosso modo, quando você guarda um dinheiro, coloca ele para render e no futuro pega ele de volta. Então, não tem como você juntar esse instituto com a assistência, já que esse último é um valor que vai, mas não volta”, explicou.

Após expor exemplos de retiradas dos recursos do IPERN para a área de assistência, ele afirmou, com convicção, que “o déficit atuarial do instituto começou a ser constituído no dia em que ele foi instaurado”.

Ainda de acordo com Linhares, após as primeiras demonstrações do déficit atuarial, em 1987, os benefícios assistenciais foram suspensos, restando somente o centro clínico, que foi extinto em 2002.

“E a última grande pancada sofrida pela Previdência do RN foi em 2014, com a LC 526. Anteriormente, em 2006, havia sido feita uma segregação – e se conseguiu juntar R$ 1 bilhão num fundo específico. Porém, em 2014, o governo da época consumiu tudo em 8 meses, após a aprovação da lei, mesmo diante de tentativas judiciais de se impedir o procedimento. E esse foi, portanto, o golpe final à nossa previdência”, opinou.

O presidente da entidade complementou, falando que “a partir dali houve a elevação dos déficits atuarial e financeiro. Em 2011, o déficit atuarial estava em 8 milhões; em 2014, já estava em 80 milhões. Então, não é difícil chegar ao furo de 54 bilhões que existe hoje”, acrescentou.

Ele lembrou ainda que a responsabilidade pela Previdência é solidária – e não somente entre servidor e empregador – mas também entre os próprios empregadores.

“Com isso, eu quero esclarecer que essa não é uma dívida apenas do Executivo, mas de todos os poderes. O cálculo atuarial é feito de forma separada. Lá consta o que cabe ao Executivo, Legislativo, Judiciário, Ministério Público etc”, disse.

A respeito das inúmeras modificações nos planos de cargos e carreiras de diversas categorias de servidores do Estado, ao longo dos anos, o presidente do IPERN afirmou que “nunca se deve fazer um planejamento de aumento para os servidores ativos sem considerar a questão previdenciária, inclusive o cálculo atuarial”.

“Parece-me que isso nunca foi observado. Os servidores mereciam valorização, sim, mas deveriam ter sido feitos estudos cuidadosos e responsáveis. E eu não tenho constrangimento algum em falar isso tudo aqui hoje, porque eu já venho dizendo essas coisas há, pelo menos, 20 anos – seja na imprensa, nas palestras que ministro ou em artigos que escrevo”, enfatizou.

Finalizando seu discurso, Nereu Linhares garantiu que, desde que assumiu a administração do órgão, em 2019, vem modernizando equipamentos e se esforçando com sua equipe para mitigar os efeitos dos erros de gestões passadas.

“Outro problema é a proporção entre ativos e inativos. Nos anos 80/90, nós tínhamos 5 ativos para 1 inativo. Hoje essa pirâmide já se inverteu. Existem mais inativos do que ativos. Então, a conta não vai fechar nunca. Portanto, todo o Estado do RN tem que se unir para não deixar a previdência morrer – e eu não falei ‘recuperar’; eu falei ‘não deixar morrer mesmo’. E esse trabalho tem que ser conjunto: Executivo, Legislativo, Judiciário, MP, Tribunal de Contas, todos”, concluiu, reforçando que a situação é dramática e precisa ser solucionada com o auxílio de especialistas no assunto.

Dando continuidade aos debates, o representante dos aposentados, Demetrius Fernandes, avaliou que um dos maiores problemas enfrentados pelo IPERN são os benefícios em que o tempo de recebimento ultrapassa o tempo de contribuição.

“E eles estão cobertos pela legislação, então não temos o que fazer. Ainda há os servidores que recebem uma porcentagem a mais sobre a contribuição que fizeram; e servidores que não eram efetivos, mas o IPERN paga o benefício, porque a lei garantiu. E tudo isso foi criando um problema difícil de resolver”, elencou.

O servidor inativo falou também sobre a importância da realização de um concurso público para o instituto. “Nós queremos muito que seja realizado esse certame, para que o órgão não morra. A situação é difícil, mas dá para reverter, se todos nos unirmos”, disse.

O membro da Secretaria de Administração e Recursos Humanos do RN, Carlos Cerveira, acredita que o foco agora deve ser a resolução do problema, esquecendo o que já passou.

“Historicamente, a maior parte dos nossos servidores amargou 10 a 12 anos sem qualquer tipo de recomposição remuneratória. E eu acho que agora não é mais o momento de falar sobre a ‘febre dos planos de cargos’. No momento, nós precisamos pensar em como solucionar o problema e não retroceder”, ressaltou.

Segundo o representante do Governo do Estado, “é preciso discutir o que será sustentável para toda a sociedade”.

“Hoje nós temos 60.542 servidores inativos e pensionistas, e o quadro de ativos está em torno de 54 mil. Se formos contar os efetivos, esse número cai, porque temos os comissionados, terceirizados, temporários etc. Então, a massa contributiva vem caindo no decorrer das décadas. Por isso, não há como a gente falar em promover uma política mais arrojada para recompensar os servidores. Seria justo, sim. Mas precisamos compreender que esse recurso tem que sair de algum lugar. E esse é o maior problema”, alertou.

Já o promotor de Justiça, João Vicente, representante da Procuradoria-geral do Estado, reconheceu que a estrutura interna do IPERN não está adequada aos desafios que a entidade enfrenta.

Para o supervisor técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), Ediran Teixeira, os servidores públicos não podem pagar uma conta que foi gerada por erro do Estado.

“Os servidores não podem pagar essa conta, só porque tiveram reajustes de salários no passado. Quem administra o IPERN é o Estado, não seus funcionários. O déficit se acumulou ao longo do tempo por causa dos inúmeros erros de gestão, seja por motivos políticos ou deficiências administrativas. E a conta está aí. Então, é responsabilidade do Poder Público recompor esse dinheiro que foi retirado dos servidores. Os órgãos precisam se unir e decidir de onde vão tirar recursos para repor aos cofres do IPERN”, finalizou.

Último membro da mesa a falar, o representante do Sindicato dos Servidores Públicos da Administração Indireta (SINAI/RN), Valmir de Araújo, pediu compromisso de todos os Poderes (Legislativo, Executivo, Judiciário, além do MP e do Tribunal de Contas), “para que se debrucem de forma séria sobre o tema da Previdência Social e solucionem a questão de uma vez por todas”.

Segundo ele, o SINAI é bastante combativo e atua em 14 órgãos. “Portanto, a gente espera que esta audiência pública tenha início e fim – com objetividade e clareza, para que a gente resolva a situação, porque ninguém está de brincadeira. Todos nós queremos sair daqui hoje com ações concretas e resolutivas”, concluiu.

Ao final do debate público, o deputado Nelter Queiroz citou como encaminhamentos: 1- Urgência na publicação do edital do concurso do IPERN; 2- Implantação de nova tabela de vencimentos básicos dos cargos públicos de proventos do IPERN, conforme estudo realizado pelo seu gabinete; 3- Urgência na resposta ao TCE/RN sobre o planejamento atuarial e a devolução de saques à previdência estadual; 4- Cumprimento do Decreto nº 26.421/2026, que regulamenta a estrutura do IPERN e determina que 50% dos cargos comissionados devem ser ocupados por servidores efetivos da própria instituição.