Governo vai antecipar cobrança de ICMS para ajustar fluxo de caixa

Uma nova portaria da Secretaria da Fazenda do Rio Grande do Norte (Sefaz-RN) altera a forma de arrecadação do ICMS para empresas beneficiárias do Programa de Estímulo ao Desenvolvimento Industrial do RN (Proedi), assim como para atacadistas e centrais de distribuição que usufruem de benefícios fiscais. A partir de outubro, essas empresas deverão pagar 50% do imposto antes mesmo de realizar as vendas. Com isso, a entrada de cerca de R$ 30 milhões nos cofres públicos será antecipada. Para o setor produtivo, a medida pode prejudicar a geração de empregos, investimentos e fluxo de caixa.
Conforme a secretaria, o objetivo é ajustar o fluxo de receitas sem aumentar o valor do imposto. O Governo também informou que, caso não fosse implementada a antecipação, poderiam ser revistos benefícios fiscais concedidos pelo Estado. O valor pago antecipadamente será compensado integralmente no recolhimento do dia 15 de novembro. Além disso, as empresas devem quitar até 28 de outubro 50% do imposto devido no mês anterior ao da ocorrência do fato gerador. O descumprimento do prazo pode acarretar a aplicação de multas e juros.
Na prática, se uma companhia recolheu R$ 100 mil de ICMS em setembro, deverá pagar até 28 de outubro R$ 50 mil — equivalente a 50% do valor devido no mês anterior ao da ocorrência do fato gerador. Esse montante será integralmente abatido do imposto a ser recolhido em 15 de novembro, referente às operações de outubro.
Em nota enviada à Tribuna do Norte, a pasta esclarece que a portaria “é uma medida que visa adequar o fluxo de receitas do estado e que alcança somente as empresas que usufruem de benefícios fiscais, como as beneficiárias do PROEDI e dos regimes especiais de atacadistas e centrais de distribuição”.
O presidente da FIERN, Roberto Serquiz, criticou a decisão, afirmando que a antecipação compromete diretamente o fluxo de caixa das empresas e não contribui para a melhoria do ambiente de negócios. “A antecipação compromete diretamente o fluxo de caixa das empresas, justamente em um cenário que exige liquidez para manter investimentos e empregos”, disse.
O Proedi concede descontos no ICMS para empresas quando se instalam ou desejam ampliar suas instalações no território potiguar. O benefício fiscal é voltado tanto para novos empreendimentos industriais quanto para aqueles já existentes no estado. Segundo Serquiz, a portaria deixa o sistema jurídico mais frágil. “Altera a previsibilidade do PROEDI — que é um de seus pilares fundamentais — fragilizando a segurança jurídica e afetando a confiança dos empreendedores nas políticas de incentivo do Estado”, ressaltou.
O dirigente destaca ainda que o planejamento financeiro das empresas será impactado com a antecipação da arrecadação, gerando risco direto à competitividade. “No curto prazo, afeta o planejamento financeiro e o capital de giro. No médio prazo, pode desestimular investimentos, comprometer a geração de empregos e reduzir a atratividade do Estado frente a outros mercados”, pondera Serquiz.
Além disso, não houve consulta prévia com a FIERN, a Fecomércio e a FAERN para a adoção da medida. “Uma medida com esse impacto merecia diálogo com quem gera emprego, renda e investimentos no Estado”, afirmou Roberto Serquiz.
A medida, segundo a Sefaz, foi implementada após comunicação oficial às empresas por meio do Domicílio Tributário Eletrônico (DTE), sistema utilizado pelo governo para notificação de obrigações fiscais e envio de informações importantes sobre tributos.
A Sefaz-RN avalia a antecipação do ICMS como “essencial para a realização do fluxo de receita neste momento” e destaca a importância da medida para garantir a organização financeira do estado. A secretaria esclarece que o recolhimento antecipado dos impostos, estimado em R$ 30 milhões, não tem destinação específica, sendo utilizado de forma geral para sustentar investimentos públicos, custear a manutenção da estrutura administrativa e assegurar o funcionamento regular dos serviços essenciais do governo.
Segundo a Sefaz, sem essa reorganização do calendário de arrecadação, a gestão das finanças estaduais poderia enfrentar dificuldades no cumprimento de obrigações e compromissos, afetando diferentes áreas da administração pública e prejudicando a execução de despesas e investimentos planejados. A secretaria acrescenta que, na ausência da medida, todos os setores seriam impactados, o que poderia comprometer a manutenção da estrutura do governo e a capacidade de atendimento às demandas da população. “Poderiam ter sido revistos benefícios fiscais já adotados em outros estados, mas esta não é a intenção do governo”, complementou a pasta.
Fecomércio critica
O presidente da Fecomércio RN, Marcelo Queiroz, considera que “é necessário aprofundar o diálogo técnico para compreender plenamente o alcance da medida, bem como avaliar os seus efeitos diretos e indiretos sobre as empresas atacadistas e as centrais de distribuição”.
Para ele, “a previsibilidade e a estabilidade nas regras fiscais são fundamentais para garantir um ambiente de negócios saudável e atrativo a investimentos. Mudanças repentinas podem resultar em aumento de custos, retração nas operações e riscos à manutenção de empregos em toda a cadeia de comércio e serviços”.
Além disso, Marcelo Queiroz disse que “alterações dessa natureza, quando implementadas sem a devida discussão prévia com o setor produtivo, geram insegurança, comprometendo diretamente o planejamento financeiro das empresas”.
Empregos podem ser afetados
A Faern também prevê impactos significativos, principalmente para empresas com capital de giro menor. “Embora tecnicamente não represente aumento de carga tributária, a exigência de antecipação pode, na prática, comprometer o equilíbrio financeiro de muitas empresas, dificultando o cumprimento de obrigações operacionais e trabalhistas”, disse a instituição.
Segundo a Faern, a curto prazo, a medida pode obrigar as empresas afetadas a realizarem ajustes financeiros e operacionais, impactando na geração de empregos no setor. “Isso pode impactar desde a gestão de estoques até o pagamento de fornecedores e colaboradores.”
No médio prazo, o impacto dependerá da forma como a política será implementada e da capacidade de diálogo entre o Governo do Estado e o setor produtivo, conforme a Faern.
“Se devidamente ajustada à realidade setorial e implementada com diálogo e flexibilidade, a medida pode contribuir para o equilíbrio fiscal do Estado sem comprometer a competitividade das empresas. No entanto, se aplicada de forma rígida, sem análise de impacto ou espaço para negociação, há o risco de prejudicar o ambiente de negócios local, desestimular investimentos e comprometer a manutenção de empregos”, destacou a Faern.
Tribuna do Norte