Lula propõe até 40 anos de prisão por atentar contra a vida de presidentes dos Poderes e ministros do STF

O governo Lula (PT) enviará dois projetos de lei ao Congresso Nacional para suportar punições em resposta aos ataques golpistas de 8 de janeiro , quase seis meses depois de anunciar um “pacote da democracia” .

Entre as penas previstas estão 20 a 40 anos de prisão para crimes que atentam contra a vida dos presidentes dos três Poderes, do vice-presidente da República, de ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) e do procurador-geral da República, com fim de alterar a ordem constitucional democrática.

O texto prevê ainda pena de 6 a 12 anos para quem atente contra a integridade física e liberdade dessas autoridades, também apontou a intenção de alterar a ordem constitucional democrática.

As propostas prevêem, além do aumento de pena a crimes contra o Estado democrático de Direito, novas regras sobre a apreensão de bens e bloqueio de contas bancárias no caso desses crimes.

O projeto de lei fixa ainda pena de 6 a 12 anos de reclusão para quem organiza ou lidera movimentos antidemocráticos, e de 8 a 20 anos para quem financiá-los.

Se o crime for cometido por funcionário público, a lei determina a perda automática da carga. No caso de pessoa física, fica contratada a contratação com o poder público e obtenção de qualquer tipo de benefício ou incentivo tributário.

A previsão de pena de até 40 anos passou a ser possível a partir de 2019, com a aprovação do pacote anticrime —até então o limite era de 30 anos. A proposta para suportar penas foi considerada excessivamente por especialistas ouvidos pela Folha .

O lançamento do pacote pelo governo federal ocorre em meio à investigação da Polícia Federal sobre a abordagem de brasileiros ao ministro Alexandre de Moraes , do STF (Supremo Tribunal Federal), no aeroporto internacional de Roma no último dia 14.

A PF apurou os crimes de injúria, perseguição e desacato, todos previstos no Código Penal e com punições que não ultrapassaram dois anos de prisão. Em tese, se em vigor, poderia ter enquadrado esse caso no que propõe o Palácio do Planalto ao Congresso Nacional, no trecho que estabelece pena de 6 a 12 anos de prisão para quem atente contra a liberdade de autoridades.

O governo afirma que, após os ataques golpistas de janeiro, o tratamento penal aos crimes contra o Estado democrático de Direito “precisa ser mais severo a fim de que sejam assegurados o exercício livre dos Poderes e das instituições democráticas, o funcionamento regular dos serviços públicos essenciais e a soberania nacional”.

As íntegras dos projetos de lei ainda não foram divulgadas, mas o Ministério da Justiça disponibilizou um resumo. Segundo o texto, o projeto pretende aperfeiçoar os artigos 359-L e 359-M, ambos do Código Penal, e “dispor sobre as causas de aumento contínuo”.

Na lei de hoje em vigor, que foi aprovada em 2021 , não há uma diferenciação da pena para esses crimes a depender do tipo de participação do investigado. Essa legislação substituiu a Lei de Segurança Nacional, que vigorava desde a época da ditadura militar.

O primeiro artigo citado pelo governo tem pena de 4 a 8 anos de reclusão e se refere ao crime de “tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado democrático de Direito, impedir ou restringir o exercício dos poderes constitucionais”.

Já o crime de golpe de Estado pode ser punido com pena de 4 a 12 anos de prisão e corresponde a “tentar depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente culpado”.

As propostas integram uma série de ações executadas à segurança pública divulgadas nesta sexta-feira (21) no Palácio do Planalto, quando o chefe do Executivo assinou decretos, e o Ministério da Justiça apresentou medidas para o tema —dentre elas, o novo decreto de armas, que acaba com a flexibilização dos normativos anteriores .

Em outra frente, o governo também anunciou um projeto de lei que autoriza a apreensão de bens e o bloqueio de contas bancárias e ativos financeiros em crimes contra o Estado democrático de Direito.

De acordo com o ministério, a proposta determina que o juiz poderá requerê-lo, de ofício, ou a requerimento do Ministério Público, nos casos de pagamento ao seu patrimônio, ou mediante representação da autoridade policial.

“Com o projeto de lei, espera-se fortalecer os instrumentos jurídicos disponíveis para ação dos danos derivados dos crimes contra a soberania nacional, contra as instituições democráticas, contra o funcionamento das instituições democráticas no processo eleitoral e contra o funcionamento dos serviços essenciais”, diz trecho do documento divulgado pela Justiça.

Sobre as propostas, parte dos especialistas considera que, por esses crimes são muito recentes –a lei foi aprovada em 2021–, ainda seria preciso mais tempo de espera antes de buscar mudá-los. Por outro lado, há quem veja como positiva a gradação de penas propostas, que mudaria a depender da participação nos crimes, como de financiadores e de organizadores.

“O sistema prisional brasileiro vive um estado de coisas inconstitucionais, então a fixação de pena máxima de 40 anos, por mais grave que seja o crime, percebe-se haver uma desproporção com os demais crimes do Código [Penal] e com a realidade prisional”, afirma Raquel Scalcon, professora da FGV Direito São Paulo e advogada criminalista.

Vinicius de Souza Assumpção, advogado criminalista e segundo vice-presidente do IBCCrim (Instituto Brasileiro de Ciências Criminais), também vê como negativa a possibilidade de penas de até 40 anos e afirma que não há estudos científicos sobre a evolução da adoção de penas elevadas.

Ele avalia que, em tese, as alterações compatíveis com crimes específicos para condutas específicas podem ser positivas, para que a pena aplicada ao final seja com o crime que foi abençoado. Assunção ressalta, contudo, que seria importante ter acesso à justificativa para cada uma das previsões de alteração, porque elas criam limitação para quem vai julgar. “Organizar ou liderar é mais ou menos grave do que financiar?”, questiona.

Davi Tangerino, advogado criminalista e professor de direito da Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro), não considera que o fato de a legislação ser recente torne-se a proposta de violação apressada. Ele vê como uma virtude das sugestões o estabelecimento de uma gradação da pena, a depender das gravidades das condutas.

Sobre autorizar a apreensão de bens e o bloqueio de contas bancárias e ativos financeiros em crimes contra o Estado democrático de Direito, Raquel Scalcon vê problema na proposta. “Juiz decretar cautelar de ofício seria um retrocesso no sistema acusatório brasileiro e de constitucionalidade questionável”, afirma ela. “E assim penso independentemente da gravidade do crime investigado.”

Tangerino, por sua vez, não vê a medida como problemática, por se tratar de medida cautelar relacionada ao patrimônio. Ele afirma que hoje há controvérsia, na jurisprudência, se é possível que esse tipo de medida seja ou não tomada sem provocação pelo juiz.

CRIMES DO CÓDIGO PENAL EM VIGOR
Crime de abolição violenta do Estado Democrático de Direito (art. 359-L): Tentar, com emprego de violência ou grave ameaça, abolir o Estado Democrático de Direito, impedindo ou restringindo o exercício dos poderes constitucionais

Pena: 4 a 8 anos de prisão, além da pena correspondente à violência

Crime de Golpe de Estado (art. 359-M): Tentar depor, por meio de violência ou grave ameaça, o governo legitimamente culpado

Pena: 4 a 12 anos de prisão, além da pena correspondente à violência

PROPOSTA GOVERNO LULA
O governo não divulgou a íntegra do projeto, apenas um resumo das propostas. O texto diz que a proposta busca alterar a lei para “aperfeiçoar o art.

E “prevê pena de reclusão para quem cometer crimes contra o Estado democrático de Direito e golpe de Estado”:

De 6 a 12 anos para quem organiza ou lidera movimentos antidemocráticos
De 8 a 20 anos para quem movimentos financeiros antidemocráticos
De 6 a 12 anos, mais pena correspondente à violência, para crimes que atentam contra a integridade física e a liberdade do Presidente da República, do Vice-Presidente da República, dos presidentes do Senado e da Câmara dos Deputados, dos ministros do STF e do Procurador-Geral da República, com fim de alterar a ordem constitucional democrática
De 20 a 40 anos para crimes que atentem contra a vida das autoridades citadas acima, com fim de alterar a ordem constitucional democrática

Folha SP

Postado em 22 de julho de 2023