Ministério da Fazenda quer limitar supersalários e mudar seguro-desemprego para reduzir despesas
Limitar os supersalários no setor público e mudanças no desenho do seguro-desemprego estão na lista de medidas em estudo no Ministério da Fazenda para cortar despesas levadas ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Um integrante da equipe econômica confirmou à Folha que a ideia é buscar um acordo no Congresso para aprovação do projeto de lei que regulamenta os supersalários e limita a poucas exceções o pagamento fora do teto remuneratório do funcionalismo, que tem como base o salário dos ministros do STF (Supremo Tribunal Federal), atualmente em R$ 44 mil.
A informação foi antecipada pela TV Globo. Um projeto de lei já tramita no Legislativo desde 2016. O assunto voltou ao radar um ano após Haddad ter se reunido com a ministra da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos, Esther Dweck, e anunciado que a medida seria prioritária para o governo.
Na época, havia uma pressão do presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), para Lula apresentar uma proposta de reforma administrativa. As estimativas apontam que a medida pode reduzir em cerca de R$ 3,8 bilhões as despesas com a folha de salários.
O projeto lista quais tipos de pagamentos podem ficar de fora do teto do funcionalismo público, eliminando os chamados “penduricalhos”, que são incorporados aos vencimentos dos servidores e acabam permitindo o pagamento dos salários em valores muitos superiores ao teto.
Há uma expectativa de que o foco numa medida de reforma administrativa possa criar uma ambiente mais favorável à aprovação de outras medidas fiscais de interesse do governo.
As mudanças no desenho do seguro-desemprego levadas ao presidente também estão na lista, segundo informaram, nesta terça-feira (15), pessoas do governo a par das discussões sobre a revisão de gastos.
Como mostrou a Folha há duas semanas, uma das propostas com mais chance de avançar, na avaliação de integrantes da equipe econômica, é a que prevê o abatimento da multa que o trabalhador recebe ao ser demitido do valor do seguro-desemprego.
Com esse mecanismo, a área econômica considera que é possível diminuir o valor total do benefício e o número de parcelas do seguro a ser pago. Quanto mais alta a multa, menor seria o valor do seguro-desemprego a ser pago pelo governo.
Há uma proposta também para cobrar com alíquota maior do PIS/Cofins dos setores com maior rotatividade de trabalhadores, que demandam mais seguro-desemprego.
O argumento levado ao presidente é que o número de beneficiários do benefício está subindo muito, mesmo com a economia brasileira aquecida e o desemprego em baixa. Essas despesas saltaram de R$ 47,6 bilhões, no acumulado em 12 meses até agosto do ano passado, para R$ 52,4 bilhões, até o mesmo mês deste ano. Para 2025, a previsão na proposta de orçamento enviada pelo governo ao Congresso é de R$ 56,8 bilhões
Na semana passada, o próprio presidente Lula chamou atenção ao tocar nas mudanças do mercado de trabalho. Ele afirmou que o PT precisa se adaptar às mudanças no mundo do trabalho, que abalaram as bases históricas do partido, e que a realidade e as demandas dos empregados não se resumem mais ao registro formal em carteira.
Lula afirmou que é preciso refletir como mudou o mercado do trabalho desde os tempos de fundação da legenda, nos anos 1980 e disse que o PT tem dificuldade de adaptar o discurso ao novo cenário.
A fala de Lula foi lida como um sinal positivo por integrantes do governo para as mudanças no seguro-desemprego.
À colunista Mônica Bergamo, da Folha, Haddad afirmou que tem tido mais tempo para conversar com o presidente sobre a dinâmica dos gastos do governo e o impacto deles na dívida pública. Haddad admitiu que dívida “só cresce”, fato que vinha sendo minimizado publicamente pela equipe do ministro. Resolver esse problema, disse Haddad, é “premente” e está “na ordem do dia”.
Após piora dos temores do mercado financeiro com o risco de Lula adotar medidas consideradas populistas pelos investidores, Haddad retomou nesta semana a coordenação de expectativas em torno do pacote de medidas estruturais de revisão de gastos.
Desde julho, quando houve uma escalada do dólar frente ao real devido ao pessimismo com as contas públicas, o ministro Haddad busca convencer o presidente Lula da necessidade de fazer medidas mais estruturais de contenção de despesas para a sobrevivência do arcabouço fiscal.
Na época, Lula deu sinal verde para o anúncio de um corte de despesas obrigatórias de R$ 25,9 bilhões em 2025, patamar insuficiente para reverter a pressão de crescimento dos gastos sobre o novo arcabouço fiscal.
De lá para cá, várias propostas em estudo pela equipe econômica foram divulgadas na imprensa, como a desvinculação dos benefícios da Previdência do salário mínimo, mudanças na forma de correção dos pisos constitucionais da saúde e educação e até reformulações pontuais, como reforço no pente-fino de aposentadoria por invalidez.
Entre as propostas mais defendidas por técnicos dos ministérios da Fazenda e do Planejamento está o redesenho do abono salarial, espécie de 14º pago a trabalhadores com carteira assinada que recebem até dois salários mínimos. Em 2025, o benefício vai custar R$ 30,7 bilhões.
Uma das medidas é fixar a regra de concessão passe a ser a renda familiar per capita (por pessoa), limitado a uma pessoa por família. A mudança no abono salarial, já tentada sem sucesso por vários ministros da Fazenda, é defendida pela equipe econômica, mas enfrenta resistências políticas.
A ministra do Planejamento e Orçamento e Gestão, Simone Tebet, e integrantes da Fazenda também defendem mudanças nas regras de previdência dos militares das Forças Armadas. O próprio presidente Lula deu aval para a ministra Esther Dweck estudar as medidas.
Em entrevista à Folha, no início de setembro, Tebet informou que três medidas estavam na mesa. “Não precisa fazer uma ampla reforma porque não passa. Mas vamos fazer aquilo que é possível. Tem três medidas que estão sendo analisadas”, afirmou a ministra, que está à frente do programa de revisão de gastos e aperfeiçoamento de políticas públicas do governo. Os militares, no entanto, resistem a qualquer mudança.
Folha de São Paulo