Nelson Piquet tem recurso negado em condenação milionária por racismo e homofobia

O empresário e ex-piloto de Fórmula 1 Nelson Piquet recorreu contra a decisão que o condenou a pagar R$ 5 milhões por declarações racistas e homofóbicas para se referir ao piloto britânico Lewis Hamilton em entrevista. Piquet teve os embargos apresentados por sua defesa, que alegou “omissão no ato judicial”, negados, como informou mais cedo a coluna de Ancelmo Gois no jornal O Globo.

A juíza Thaissa de Moura Guimarães decidiu que “o julgador não está obrigado a se pronunciar individualmente sobre todos os pontos e dispositivos legais mencionados pelas partes, mas apenas em relação àqueles que julgar contundentes o suficiente para influir no provimento jurisdicional que se reclama”, e negou todos os embargos apresentados pela defesa do ex-piloto. A decisão foi publicada no Diário de Justiça do Distrito Federal (DJDF) de 31 de Maio de 2023.

A contundência das falas de Piquet em entrevista de 2021 pode ser medida pelos termos e expressões usados para se referir ao heptacampeão da Fórmula 1 Lewis Hamilton.

  • O “neguinho” meteu o carro e deixou. O Senna não fez isso. O Senna não fez isso. Ele foi, assim, “aqui eu arranco ele de qualquer maneira”. O “neguinho” deixou o carro. É porque você não conhece a curva; é uma curva muito de alta, não tem jeito de passar dois carros e não tem jeito de passar do lado. Ele fez de sacanagem – disse Piquet em entrevista, usando o termo “neguinho”.
  • O Keke (Rosberg)? Era uma bosta. Não tinha valor nenhum. É que nem o filho dele (Nico), ganhou um campeonato, o “neguinho” devia estar “dando mais c…” naquela época e estava meio ruim – completou em outro momento.

A ação contra Piquet foi movida pela Educafro, que busca “a inclusão da população negra e pobre em universidades públicas e particulares com bolsa de estudo”; o Centro Santo Dias, de defesa dos direitos humanos, a Aliança Nacional LGBTI+ e a Associação Brasileira de Famílias Homotransafetivas, ambas ligadas à causa LGBTQIA+. As quatro entidades pediram R$ 10 milhões no processo, como “reparação de dano moral coletivo e dano social infligidos à população negra, à comunidade LGBTQIA+ e ao povo brasileiro de modo geral”.

Segundo os autores, Piquet, “líder e expoente do esporte brasileiro, em manifestação explícita de racismo e de homofobia, violou a um só tempo o direito fundamental difuso à honra da população negra e da comunidade LGBTQIA+”.

O juiz Pedro Matos de Arruda, 20ª Vara Cível de Brasília, no entanto, sentenciou Piquet ao pagamento de R$ 5 milhões. Sentença que permanece válida após a decisão da juíza Thaissa de Moura Guimarães.

Na época da sentença, o juiz citou que as falas de Nelson Piquet não podem ser desprezadas, uma vez que se trata de uma pessoa pública mundialmente conhecida e com potencial de influência sobre seus admiradores: “Esta ofensa é intolerável. Mais ainda quando se considera a projeção que é dada quando é uma pessoa tão reconhecida e tão admirada como o réu. Assim, tenho que o dano moral coletivo está caracterizado, porque houve ofensa grave aos valores fundamentais da sociedade”, escreveu o juiz.

Para o cálculo da multa, o juiz considerou uma doação que Piquet fez para a campanha de reeleição do ex-presidente Jair Bolsonaro, em 2022, no valor de R$ 501 mil. De acordo com a decisão, como a Justiça Eleitoral limita o valor de doação a 10% dos rendimentos brutos do doador no ano anterior à eleição, Piquet teria arrecadado em 2021 ao menos R$ 5 milhões. O juiz considerou que o patrimônio do ex-piloto é superior a esse valor.

“Desta forma, considerando que o réu se propôs a pagar mais de R$ 500.000,00 (quinhentos mil reais) para ajudar na campanha eleitoral de um candidato à presidência república, objetivando certamente a melhoria do país segundo as suas ideologias, nada mais justo que fixar a quantia de R$ 5.000.000,00 (cinco milhões de reais) – que é o valor mínimo de sua renda bruta anual – para auxiliar o país a se desenvolver como nação e para estimular a mais rápida expurgação de atos discriminatórios.”

A indenização por danos morais coletivos deve ser destinada a fundos de promoção da igualdade racial e contra a discriminação da comunidade LGBTQIA+, segundo a determinação da sentença inicial.

GE

Postado em 6 de junho de 2023