Pai depois dos 50 anos: principais desafios, rotinas e o que a maturidade traz de positivo

Ser pai ao 50 anos, pela primeira vez ou não, representa novos desafios e rotinas na vida de um homem. A criação das crianças é beneficiada pela experiência de vida adquirida por ele, no entanto, outras dificuldades surgem, como certas limitações.

É o caso do coronel do Exército aposentado João Lacerda, de 66 anos, que tem quatro filhos. A última deles, Rosalva, nasceu há dois anos, em seu segundo casamento. Os outros três nasceram a partir de quando ele tinha 30.

Lacerda conta que ele e a mulher, Juliana, que hoje tem 28 anos, desejavam ter filhos, mas que ela planejava fazê-lo somente após concluir os estudos, o que não foi viável para ele por causa da idade.

“Eu falei para ela: ‘Você pode esperar tranquilamente 8 anos, mas eu não. Já estou com 64 anos. Com mais 8, vou ter 72 anos’. Então, seria mais difícil para mim cuidar de um bebê. Foi uma escolha e uma necessidade”, diz.

“Eu cheguei a dizer para ela: ‘Se eu tiver filho com 80 anos, como é que vou levá-lo para a escola?’. Existem certas limitações da idade”, complementa.

Desde então, ele tem vivido se dedicando quase totalmente para o casamento e a filha.

“Em relação ao tempo, o idoso tem uma vantagem [ao se tornar pai], porque está aposentado. Eu não tenho que cumprir um expediente de trabalho. Estou 100% disponível para a filha. Não tem a disposição física, mas tem a disponibilidade de tempo. Uma coisa compensando a outra”, comenta.

Para Lacerda, ser pai após os 60 anos agrega pontos positivos para a filha, mas também para ele.

“Já tenho uma bagagem. Todo aprendizado na criação dos meus primeiros filhos, aplico na criação dessa vez (…) Sem contar que ter um filho nesta idade aumenta a minha disposição. Tenho mais vontade de fazer atividades físicas, até mesmo para acompanhar”.

A psicóloga Michelle de Lima destaca que a maturidade pode propiciar uma relação mais saudável com os filhos, com maior capacidade de escuta e paciência.

No entanto, ela argumenta que não está associada exclusivamente à idade avançada e que “isso apenas pode acontecer se o pai também estiver emocionalmente disponível para estar junto e acolher os filhos”.

“A maturidade é sempre bem-vinda em qualquer idade”, pontua.

Já o professor e engenheiro civil Eduardo Barros, de 60 anos, tem dois filhos pequenos, Eduardo Antônio, 10, e Maria Luisa, 14. Como ainda não é aposentado, não tem tanto tempo livre com as crianças quanto João Lacerda.

No entanto, diz que, por causa da idade, passou a fazer a escolhas entre a família e o trabalho, para estar mais presente em alguns momentos do que esteve antes, com as duas filhas mais velhas, que teve quando tinha entre 32 e 34 anos de idade.

“Tenho mais tempo com os pequenos, não pela idade, uma vez que me encontro ainda na ativa, com trabalhos como engenheiro e como professor, mas por um propósito de vida. A ideia de finitude mais próxima nos dá uma régua certa para a importância de estar com eles e me direciona para isso”, diz.

Algo que também ocorreu de maneira diferente para ele foi o planejamento dos filhos mais novos.

Com mais experiência de vida, diz que escolheu, junto com sua segunda esposa, o momento certo para ter filhos.

“[As primeiras filhas] Não foram bem escolhas, tive no primeiro casamento as duas primeiras. Depois me divorciei, fiquei com a guarda delas e casei de novo. Aí, sim, na parceria com a minha segunda esposa, resolvemos ter filhos. Foi quando tivemos o casal que hoje têm 14 e 10 anos”, explica.

Para ele, o mais difícil na criação das crianças, atualmente, é participar da rotina delas.

No entanto, Barros diz perceber que há mais qualidade no tempo que dedica aos quatro filhos atualmente, após os 60 anos.

“Para os [filhos] mais novos, temos mais paciência e tolerância e estamos sempre juntos. Já para os [filhos] mais velhos, o longo caminho já feito se transforma em referência para eles”, opina.

“Os filhos só têm a ganhar com pais mais velhos”, diz o sociólogo e estudioso do envelhecimento humano Acioli Neto.

“Após certa idade, é comum que os homens já tenha alguma estabilidade financeira e que já tenham vivido dificuldades que a criança não precisará viver com eles neste momento. As coisas são mais planejadas e acontecem menos por acidente, como na juventude. Além disso, esse homem terá muito mais maturidade emocional, o que naturalmente vai ser passado para a criança no processo de desenvolvimento”, completa.

Segundo o pesquisador, os homens têm vantagens em relação às mulheres porque podem ser pais em qualquer idade, mas o fenômeno de pais mais velhos como conhecemos atualmente é algo recente.

“Ser pai após os 50 anos é considerado tardio apenas para a sociedade, mas não para o gênero. O homem está em vantagem em relação à mulher nesse caso. Há homens que se tornam pais com 80 anos, o que demonstra a saúde dele”, diz Acioli.

“No entanto, o fenômeno de pais mais velhos como vemos atualmente é recente, porque, antes, as pessoas chegavam aos 50 anos com características de 70. Os 50 são os novos 40”, pontua.

Desafios da idade e etarismo
Se tornar pai após os 50 anos de idade pode levar o homem a ser lido pela sociedade como avô, pela aparência e idade que possui.

Tanto Eduardo Barros quanto João Lacerda relatam situações que viveram esse tipo de discriminação (chamada de etarismo, ageísmo ou idadismo) baseada em uma visão preconceituosa a partir da idade das pessoas.

“Tenho uma história que é clássica [que acontece bastante]. Estava em uma loja de shopping com minha filha mais velha, de mais de 20 anos, e meu filho mais novo, na época com 7 anos. A vendedora, querendo agradar, diz ‘esse seu neto é muito lindo e parece muito com você’. Respondi de imediato que era meu filho. Ela ficou de olhos arregalados e perguntou se minha filha era a mãe, que logo respondeu que não. Sem jeito, a vendedora saiu de fininho dizendo que ia buscar outro produto, mas não voltou”, conta Barros.

Diante dessas “confusões”, é importante que a função de pai esteja bem definida na cabeça do homem para evitar prejuízos na criação e educação dos filhos, afirma a psicóloga Michelle de Lima.

“Esse pai precisa aprender que seu comportamento precisa corresponder ao de um pai”, diz.

“Em alguns casos, os avós estão ali para brincar e se divertir com os netos. O papel do pai também é esse, mas ele também tem outros papéis para desempenhar”, completa.

Apesar da situação citada não parecer grave, trata-se de um caso de preconceito que, permitido em situações menores, pode se repetir em outras mais graves, com exclusão de idosos de diversos contextos, como o profissional, por exemplo.

“O idadismo se trata do preconceito em relação à idade. Seja qual for [a situação], porém está mais ligado à discriminação contra a pessoa idosa, exclusão de determinados contextos”, explica Acioli Neto.

“As pessoas não têm que se importar com isso [a idade]. Ele tem que ser um bom pai. E ele pode ser um bom pai com mais de 50 anos”, finaliza o sociólogo.

CNN

Postado em 14 de agosto de 2023