Prazer, Vini Jr.: combate após o racismo, jogador se consolida como astro e bate recordes de interesse

Vinicius Júnior estremeceu o futebol espanhol. Seu enfrentamento a mais um ataque racista mobilizou o governo brasileiro e a ONU, manchou a imagem do país e forçou a LaLiga, organizadora do campeonato, e as autoridades locais a se movimentarem. Seu nome explodiu. Na segunda passada, dia seguinte ao jogo em que fora chamado de “macaco”, bateu o recorde do Google no Brasil e se tornou a personalidade mais buscada da história da ferramenta em 24h. “Quem é Vini Jr?” foi a segunda pergunta ligada ao assunto mais feita, mostrando que ele combustível mesmo quem não acompanha esporte. A estrela do Real Madrid, agora, não precisa mais de apresentações.

Tamanha força consolidar o jogador de 22 anos como astro do futebol. E com um diferencial. Ao contrário de ídolos como Messi, Cristiano Ronaldo e Neymar, Vini não se destaca apenas pela excelência técnica. Sua imagem de atleta vencedor está aliada à defesa de vitórias. No seu caso, o combate ao racismo. E isso num esporte carente de estrelas com este perfil, como o são, por exemplo, Lewis Hamilton, na Fórmula 1, e LeBron James, na NBA.

— É cedo demais para fazer essas comparações. Mas é inegável o papel que ele está tendo neste momento. Ele acaba sendo uma das poucas figuras do mundo do futebol que usava a voz desta maneira e com este tom — pondera Marcelo Carvalho, criador e diretor do Observatório da Discriminação Racial no Futebol: — O Vini conseguiu chamar a atenção do mundo inteiro para algo que vinha passando e nada era feito. Com essa visibilidade, mobilizou uma série de agentes que então só observavam como as coisas aconteciam atéem.

O atacante não começou a chamar as atenções para o racismo agora. E vai além de enfrentar alvos direcionados a ele. No ano passado, apadrinhou a iniciativa “Professores Pretos”, da Vivo, do Observatório e da CBF, de capacitação de treinadores negros. Em março, anunciou o desenvolvimento de um projeto antirracista voltado para crianças no Brasil. Atitudes que revelam uma estrela conectadas com a geração mais jovem, que abraçaram as questões de identidade. E que atende a uma demanda atual do mercado publicitário.

— Mudou a consciência do mundo inteiro em relação a determinadas ações que eram inadmissíveis. As empresas estão trabalhando com ESG (sigla para governança ambiental, social e corporativa, em inglês). Elas não são mais mensuradas só pela qualidade do produto delas. Mas também pelos compromissos sociais, com o meio ambiente e com a governança ética. E no campo do social está o antirracismo. Estas siglas fazem com que as empresas se valorizam. E uma crise neste sentido pode levar-las a perder valor na bolsa — diz Ivan Martinho, professor de gestão de marketing esportivo da ESPM.

Vinicius, que já havia sido o principal garoto-propaganda entre os jogadores da seleção na Copa do Catar, voltou a mostrar sua força publicitária com este episódio. Patrocinadores do atacante, como a Vivo e a Betnacional, fizeram postagens de solidariedade a ele e de repúdio ao racismo. A Nike, com quem estava em processo de disputa, foi além. Estampou pelas ruas de Madri e de Valência cartazes com uma foto sua e os dizem “Não olhe para outro lado”.

A adesão também veio do público. Em três dias, Vini Jr. ganhou 3 milhões de seguidores só no Instagram. Número que corresponde a quase 10% do total de 37 milhões que ele possui.

O interesse pelo jogador, de fato, nunca foi tão grande. De acordo com o Google Trends, além de ter batido o record da ferramenta no Brasil de buscas em 24h por uma personalidade, as pesquisas envolvendo ele entre domingo e terça foram 41 vezes maiores do que nas 48 horas anteriores. A segunda-feira ainda foi o quarto dia de maior procura no país sobre racismo desde o início da série histórica da plataforma, em 2004.

Protagonismo no real
A curva ascendente de popularidade acompanha a carreira dentro do campo. Vini faz sua temporada de maior protagonismo pelo Real. Balançou as redes 23 vezes e deu 19 assistências. Ninguém participou diretamente de tantos gols do tempo quanto ele. Não por acaso, já é cotado, ao lado de Haaland e de Mbappé, a preencher as lacunas que veteranos como Messi, Cristiano Ronaldo, Benzema e Lewandowski deixarão nas premiações de melhores do mundo.

Um movimento oposto ao de Neymar, nove anos mais velho. Embora ainda seja a principal referência da seleção brasileira, convive cada vez mais com lesões e com questionamentos pelo insucesso em liderar conquistas de peso. Mas o camisa 10 do PSG segue como uma das personalidades mais influentes do futebol. Ou seja: fora os gramados uma eventual mudança de protagonismo entre eles está longe.

— Neymar é a maior inspiração esportiva do Brasil neste século. Ele vive hoje o que experimentou nos últimos 15 anos. Vinicius está se firmando como uma voz muito forte em causas que vão além do campo e seguindo caminho próprio — opina Bernardo Pontes, sócio da ALOB Sports, agência especializada em marketing de influência no esporte.

O GLOBO

Postado em 29 de maio de 2023