‘Puro lucro’: golpistas vendem cartão clonado a R$ 35 nas redes sociais.

Golpistas passaram a usar redes sociais , como o Twitter, para atrair interessados ​​em comprar e alugar cartões clonados. Por meio de aplicativos como WhatsApp e Telegram, eles divulgam relatos de créditos de clientes satisfeitos com a aquisição e exibindo produtos comprados com o dinheiro extraviado, segundo mensagens vistas por Tilt .

“Quem compra nunca se arrepender. Material tá puro lucro, vamos pra cima (sic)”, diz o dono do perfil “Professor do 7 cartão clonado” no Twitter, que soma 2.711 seguidores.

Segundo especialistas consultados pela reportagem, as práticas descritas caracterizam diversos crimes, como:

fraude eletrônica;
roubo de identidade;
acesso não autorizado a computadores;
lavagem de dinheiro;
conspiração.
Por meio das contas, os criminosos oferecem os seguintes pacotes:

Cartão clássico com R$ 300 de saldo por R$ 35;
Tipo Black com R$ 900 de saldo por R$ 80;
Outros com saldo entre R$ 5 mil e R$ 8 mil custam em torno de R$ 460.
Para seduzir clientes, exibem “casos de sucesso”: celulares, aparelhos de ar-condicionado, placas de vídeo e TV Smart comprados com os cartões e colocados nas contas de outras pessoas.

Em publicação de 4 de outubro de 2022, o perfil “Lobo Mal CCS (cartão clonado)”, também no Twitter, exibe um print do WhatsApp em que clientes comemoram o sucesso da compra de um celular Xiaomi Redmi 10 por R $ 1.185,49 , uma transação realizada com cartão clonado.

Seguindo por 1.598 contas e ativo desde novembro de 2019, o perfil indica em sua descrição um link para um número no WhatsApp em que é possível negociar os cartões. A permanência desse perfil no ar por mais quase quatro anos é fato raro.

Um vendedor de cartões clonados afirmou à Tilt que as páginas de comércio do tipo nas redes sociais são rejeitadas recorrentemente, fazendo com que tenham que construir uma nova identidade sempre que necessário. A tendência é comprovada pelas outras cinco contas que foram abordadas, mas não toparam falar. A constante troca de perfis, diz ele, atrapalha o lucro mensal, que varia entre os vendedores. Ele não quis revelar quanto costuma faturar.

O vendedor, que pediu para não ter nome e negócio exposto, mas possui um dos perfis mais populares, com 3 mil seguidores, explica que os cartões comercializados têm três origens:

Por meio de extravios a partir de agências bancárias;
Das ruas após golpes da maquininha aplicados por ambulantes;
De dados financeiros vazados; o comércio costuma acontecer em sites da dark web (espécie de internet invisível).

Varejo de contas alugadas

No grupo do Telegram “CC’s e Laranjas”, o vendedor que se apresenta como Braga explica diariamente que os cartões e as laranjas (contas que podem ser alugadas para despistar a origem e, por vezes, o ponto final de uma transação econômica) têm recursos e disponibilidade finitos. Portanto, os usuários devem esperar para acioná-lo.

Por volta das 12h de 7 de março, Braga anunciou no grupo: “VOU ENCERRAR AS VENDAS MAIS CEDO HOJE!”. Em seguida, liberou a tabela de preços, prometendo que vem com “Nome completo, CPF, Data de Nascimento…” e que dá uma garantia caso o cartão não funcione. Antes que algum comprador desatento o chamasse, ele avisou: se não souber usar, melhor nem comprar.

As ocorrem no privado, mas ele mostra, por meio de estampas que não mostram o rosto de seus clientes, o sucesso das vendas e como funcionam as coisas. Numa conversa recente, um cliente, por volta das 22h, pede para comprar uma conta com saldo, para o que recebe, na manhã seguinte, uma resposta explicando que “já tinha fechado as vendas”.

Em outros grupos, como o “Cartão de crédito CLONADOS E PIX ON”, que conta com 14 mil membros, o usuário identificado como Johnny Bravo Consultáveis, que se apresenta como gerente do grupo, republica diariamente o mesmo aviso: o grupo é devolvido à venda de cartões e notas falsas, e a única pessoa autorizada a fazer isso é ele.

“Não negociem com esses parasitas que chamam no privado. Quem chama no privado tá desesperado para dar golpe. Não negociem com terceiros”, anuncia.

O vendedor ouvido por Tilt conta que, na mesma proporção que o comércio corre solto, há aqueles que fazem ofertas falsas para extorquir os possíveis clientes.

“São os famosos lotters: enganam os clientes afirmando fazer a entrega do material, e na hora eles somem”, explica.

Como combater a prática?
Para o delegado Thiago Chinellato, da Divisão de Crimes Cibernéticos na Polícia Civil de São Paulo, as fraudes online aumentaram assim que o covid-19 fez diversos serviços migrarem para a internet.

São diversos os crimes cibernéticos, mas com certeza, após o advento da pandemia e a migração ou aumento dos serviços e atividades na internet, observandomos um aumento das fraudes nesse cenárioThiago Chinellato , da Divisão de Crimes Cibernéticos na Polícia Civil de São Paulo

Na avaliação da advogada Adriana Cansian, especializada em segurança digital, explica que os setores público e privado ampliaram os investimentos em tecnologia e aparato legal nos últimos anos para proteger cidadãos de golpes e vazamentos de dados, como os que são comercializados no Telegram e Twitter.

Consultada pela reportagem, a Abesc (Associação Brasileira das Empresas de Cartões de Crédito e Serviços) afirma que o Brasil avançou na segurança física, mas que o mundo digital representa um desafio.

Mais de 98% das compras presenciais feitas com cartões no Brasil são por meio de cartões com chip, e toda a base de terminais de captura (POS) está preparada para receber esse tipo de transação. Em consequência desse investimento, o setor eliminou a clonagem de cartões no ambiente físico, uma vez que as informações do chip não podem ser copiadasAbecs

Eduardo Pires, gerente geral da Incognia no Brasil e especialista em prevenção à fraude e digital, explica que os criminosos brasileiros se diferenciam dos outros lugares por serem mais inventivos e especializados. “O país se destaca como um dos campeões mundiais quando o assunto é criatividade e mesmo conhecimento técnico para aplicar técnicas de engenharia social.”

Para driblar os golpistas, algumas empresas apelam à tecnologia. Empresas como Banco BMG, Serasa Experian, iFood e Rappi recorrem a uma ferramenta que usa geolocalização para validar compras. Ela cruza o padrão de comportamento do usuário com a localização em que a transação está sendo feita. A partir daí, indica a possibilidade de o cliente estar sendo vítima de um golpe. Isso ajuda a evitar roubos de contas.

Já na esfera pública, Adriana Cansian explica que o desafio para combater esse tipo de fraude é implementar os aparatos legais criados para resguardar a privacidade dos usuários e punir quem vaza dados ou os utiliza sem o consentimento deles. Ela cita a LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais) e a criação da ANPD (Autoridade Nacional de Proteção de Dados) como estruturas positivas, mas que ainda não surtiram o efeito esperado.

UOL

Postado em 1 de abril de 2023