Quer fazer seu filho crescer? Especialistas falam dos melhores (e piores) tratamentos
“Meu filho está na altura certa para a idade dele?”. A dúvida, que já era comum entre os pais, tem se tornado ainda mais frequente com os relatos de cirurgias que dão centímetros a mais viralizando nas redes.
O caso mais recente que ganhou popularidade foi o de um jovem influencer de 29 anos que gastou mais de R$ 857 mil para realizar uma cirurgia de alongamento de pernas, que pode aumentar a sua altura em até dez centímetros.
Mas, afinal, como saber se seu filho está crescendo adequadamente e, principalmente, o que fazer se houver de fato um distúrbio do crescimento? Primeiro, é preciso esclarecer que a altura de uma pessoa é resultado da combinação de vários genes herdados dos pais associada à influência do ambiente.
Em geral, cada um tem 50% de chance de ter uma altura semelhante à do pai ou da mãe. Irmãos têm 50% de chance de ficarem com alturas semelhantes e 25% de semelhança pode ser esperado em relação à altura de avós e tios. Ou seja, é bem improvável que filhos de pais medianos tenham 1,90 m.
— A expectativa dos pais é um ponto muito importante a ser abordado. Tem pais que nos procuram porque o filho quer ser jogador de basquete e quer ter 1,90 m, mas a família tem altura mediana. Isso não existe. Você não pode escolher a altura do seu filho — diz a endocrinologista Claudia Cozer, do Núcleo de Obesidade e Transtornos Alimentares do Hospital Sírio-Libanês.
Por outro lado, existem alguns fatores que podem de fato prejudicar o crescimento infantil como problemas nutricionais, doenças crônicas ou ainda distúrbios hormonais, como deficiência na produção do GH, conhecido como hormônio do crescimento. Em geral, o crescimento da criança é acompanhado pelo pediatra, com base em curvas de peso e altura que variam de acordo com a idade.
— Se a criança está abaixo da média, ela tem que ser investigada — afirma Cozer.
Uma forma de avaliar o crescimento da criança é por meio de um raio-x do punho. Esse exame avalia a idade óssea da criança e informa o médico se ela está crescendo de acordo com a sua idade cronológica. Como a genética tem grande influência na altura final da criança, também é possível fazer uma estimativa de sua altura final com base na estatura do pai e da mãe para ver se o crescimento está de acordo ou aquém dessa estimativa.
Se for constatado que a criança realmente está abaixo da curva de crescimento para sua idade ou que a altura estimada está muito aquém da dos pais, é recomendada a realização de exames adicionais. Alguns fatores que atrapalham o crescimento da criança são desnutrição, obesidade, doença celíaca, intolerância alimentar, hipotireoidismo, problemas de rim e de fígado e uso de medicamentos, como corticoides.
Se todos os fatores acima estiverem normais, é realizada a medição do GH, mais conhecido como “hormônio do crescimento”. Apesar do nome, não é o GH que faz a criança crescer, mas ele atua diretamente nesse processo ao estimular a produção de outra substância, chamada IGF. Essa sim é responsável pelo crescimento.
Existem três formas de avaliar os níveis de GH na criança. A menos usada hoje em dia consiste em pedir que a criança suba escadas no laboratório, em jejum, por um tempo determinado, porque o exercício estimula o GH.
A segunda, é realizar dosagens seriadas de hormônio de crescimento após estímulo com clonidina, um medicamento que baixa a pressão, e a terceira, consiste também em realizar dosagens seriadas do hormônio após a administração de glicose em jejum. Em geral, esses exames têm entre 1h30 e 2h de duração, pois envolvem medições sucessivas dos níveis hormonais.
Se constatada a deficiência de GH, é possível intervir. O tratamento envolve injeções diárias do hormônio, aplicadas ao deitar, por via subcutânea, por um longo prazo. Apesar de desconfortável, a picada da injeção é bem fina, semelhante à da caneta usada por pessoas com diabetes.
Em geral, o tratamento deve começar por volta dos 5 a 7 anos de idade e ser mantido até fechar a idade óssea, o que ocorre por volta dos 13 a 14 anos. A faixa etária de início do tratamento é fundamental para o seu sucesso, pois, uma vez que o crescimento natural está consolidado, não há terapia hormonal que permita continuá-lo.
— Se a criança entrou em puberdade, não adianta fazer nada, pois o crescimento já acabou — pontua a endocrinologista.
Também é preciso alertar que o tratamento só funciona em crianças com deficiência ou baixa secreção desse hormônio. Para aquelas com produção normal, a reposição não trará benefício algum.
— O GH só funciona para quem precisa. Para quem não tem deficiência do hormônio, não haverá resposta de crescimento — pontua a endocrinologista.
Além de não fazer efeito, o uso do hormônio sem indicação pode trazer efeitos colaterais, como dor de cabeça, aumento dos níveis de glicose, da resistência insulínica e do colesterol. Além de ser oneroso para a família — o tratamento de alto custo é fornecido pelo SUS ou coberto pelos planos de saúde apenas para casos comprovados de deficiência — e estresse psicológico para a criança.
Mesmo nas crianças com indicação para o tratamento, a reposição hormonal não é milagrosa. A melhora é em torno de 3 a 5 centímetros.
Cozer ressalta que a injeção é a única forma de administração do hormônio e o único tratamento disponível para estimular o crescimento na infância — exceto se a condição for causada por alguma síndrome ou doença específica.
— O GH é uma injeção subcutânea de uso diário. Qualquer outro tipo de proposta, como comprimido, spray ou gel, é enganação. Corticoide também não melhora crescimento — ressalta a especialista.
Uso de GH em meninas
Muito se fala do uso do GH em meninos, mas meninas também podem se valer do hormônio quando há uma deficiência comprovada dele, afirma a ginecologista e obstetra Marianne Pinotti, doutora em Obstetrícia e Ginecologia pela Universidade de São Paulo (USP) e colunista do GLOBO. No entanto, o GH acaba adiando a primeira menstruação. Após a menarca, a velocidade do crescimento das meninas cai drasticamente.
Outra situação que pode comprometer o crescimento das meninas é a puberdade precoce — que acaba adiantando a primeira menstruação.
— Se a menina aos 7 ou 8 anos começar a apresentar desenvolvimento das mamas ou pelos pubianos, fazemos uma avaliação. Caso ela realmente esteja se encaminhando para uma puberdade precoce, usamos um remédio que bloqueia a produção hormonal dos ovários e atrasa a puberdade.
Assim, atrasa-se a primeira menstruação, dando às meninas uma janela maior de crescimento mais acelerado.
Sono, alimentação e exercício
Como já era de se esperar, existem alguns fatores comportamentais que impactam diretamente no crescimento das crianças. São eles: alimentação, atividade física e sono. Além de garantir uma alimentação balanceada, com proteínas, carboidratos, fibras, vitaminas e minerais, é preciso acompanhar a curva de peso da criança. Isso porque tanto a desnutrição quanto o sobrepeso e a obesidade podem impactar negativamente no crescimento.
A prática de atividade física, em especial a aeróbica, é fundamental. Esse tipo de exercício estimula a secreção de GH, assim como sono.
— O GH é secretado nas primeiras horas de sono e para de ser secretado nas primeiras horas do dia. Quanto mais cedo a criança dormir, melhor porque mesmo que ela durma a quantidade de horas adequadas, se ela for dormir muito tarde, a secreção de GH será afetada. É como se tivesse um relógio na glândula e ela sabe que a criança está dormindo muito tarde. Então essas três coisas são importantes para o crescimento de qualquer criança — conclui Cozer.
Alongamento ósseo
O alongamento ósseo em si é um procedimento bem estabelecido, desenvolvido para a correção de deformidades causadas por doenças congênitas ou traumas, por exemplo. Mas, nos últimos anos, a cirurgia ganhou apelo estético por ser a única forma de “crescer” na idade adulta.
A técnica envolve quebrar o fêmur ou a tíbia e, com a ajuda de uma armação de metal, chamado de fixador, afastar gradativamente as duas metades do osso, forçando-o a cicatrizar mais longo do que antes. O procedimento gera um alongamento de um milímetro por dia. Após chegar ao tamanho desejado, o fixador ainda precisa ser mantido por mais alguns meses, até o osso se consolidar. No total, um alongamento de 5 centímetros, por exemplo, demora cerca de seis meses.
Não há um limite de alongamento para o osso em si. Entretanto, outras estruturas ao seu redor, como músculos, tendões, cartilagens e nervos, não respondem tão bem a alongamentos muito grandes. Para ajudar na recuperação e no alongamento dessas estruturas, o paciente precisa passar por sessões diárias de fisioterapia durante e depois do procedimento.
Apesar do aumento no interesse por esse tipo de procedimento, especialistas afirmam que muitos pacientes desistem quando descobrem o valor e quando entendem como é a cirurgia, o quanto demora a recuperação e os riscos envolvidos.
Além da dor e do longo período de recuperação, o alongamento ósseo envolve muitos riscos, desde aqueles presentes em qualquer cirurgia, como infecção, até os específicos. As complicações incluem embolia pulmonar, problemas de regeneração óssea, lesões vasculares, neurológicas e funcionais (limitação da mobilidade). Pode haver ainda deformação e diferença de comprimento entre as pernas.
Pacientes obesos e com problemas de coagulação têm risco aumentado. Apesar disso, a única contraindicação absoluta para a realização desse procedimento para fins estéticos é o tabagismo, pois o uso contínuo do cigarro atrapalha a consolidação do osso.
O GLOBO