Senado aprova PL das “offshores” e fundos exclusivos; texto vai à sanção

O plenário do Senado Federal aprovou, nesta quarta-feira (29), o parecer do senador Alessandro Vieira (MDB-SE) para o projeto de lei que altera as regras de tributação sobre aplicações financeiras mantidas por brasileiros no exterior, regulamenta o instrumento dos trusts no Brasil e modifica a taxação de fundos exclusivos (PL 4.173/2023).

A votação ocorreu de forma simbólica e contou com o apoio até mesmo de integrantes da oposição. Mas os senadores Carlos Portinho (PL-RJ), Cleitinho (Podemos-MG), Eduardo Girão (Novo-CE), Damares Alves (Republicanos-DF), Jorge Seif (PL-SC), Magno Malta (PL-ES), Oriovisto Guimarães (Podemos-PR) e Soraya Thronicke (Podemos-MS) registraram posição contrária à matéria.

Como o texto não sofreu alterações de mérito em relação à versão aprovada pela Câmara dos Deputados, ele segue para sanção do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

O projeto é uma das prioridades do ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), no esforço de equilibrar as contas públicas a partir da recomposição da base fiscal do Estado.

Na versão inicialmente encaminhada ao Congresso Nacional, a equipe econômica do governo estimava um ganho de arrecadação de R$ 3,2 bilhões para este ano − montante que seria utilizado para compensar a atualização da faixa de isenção do Imposto de Renda Pessoa Física (IRPF). Para o ano seguinte, as projeções apontavam para um incremento de R$ 20 bilhões nas receitas da União.

O texto votado pelos parlamentares juntou, no bojo do projeto que tratava somente das alterações para “offshores” e trusts, a mudança das regras para fundos exclusivos − movimento costurado durante a tramitação da matéria na Câmara dos Deputados após acordo com o governo.

Das pautas econômicas de interesse do Poder Executivo, esta foi a única que não precisou retornar à Câmara dos Deputados para nova deliberação por eventuais mudanças implementadas pelos senadores − resultado que foi comemorado pelo relator da matéria naquela casa, o deputado Pedro Paulo (PSD-RJ). Isso porque todos os ajustes feitos foram considerados de redação.

“O trabalho rigoroso e técnico da Câmara, somado à revisão cuidadosa do Senado, foi fundamental para que houvesse essa sintonia entre as casas e um projeto de 30 anos fosse aprovado com celeridade no Congresso. Agora teremos uma legislação mais moderna e que reduz assimetrias tributárias”, disse.

O que está em jogo
Além do impacto fiscal esperado, o governo argumenta que a medida oferece uma solução para o fato de haver mais de R$ 1 trilhão (ou US$ 200 bilhões) em ativos mantidos por brasileiros no exterior que pagam pouco ou nada de IRPF sobre rendas passivas com as regras vigentes, que permitiam o diferimento do imposto (ou seja, a procrastinação de qualquer recolhimento).

Atualmente, os investimentos de pessoas físicas no exterior podem ser estruturados de diversas formas. Uma das mais conhecidas são as sociedades − chamadas tecnicamente como Private Investment Companies (PIC), mas também referidas como “offshores”.

Nessas estruturas, o contribuinte pode utilizar de mecanismos para que a entidade intermediária afira os rendimentos de ativos, mas represe os rendimentos no exterior, passando anos sem distribuí-los ao sócio pessoa física brasileira.

Na prática, isso implica o diferimento da tributação até o momento da efetiva transferência pela entidade para o sócio pessoa física residente no Brasil, seja em conta corrente em território nacional ou no exterior, ou no uso dos recursos para o pagamento de despesas pessoais do titular. É o chamado “regime de caixa”, que deixaria de existir para os lucros aferidos por offshores a partir de 2024.

O texto aprovado unifica a tabela do imposto cobrado sobre aplicações no exterior (antes dividida entre renda e ganhos de capital), cria regras para a tributação em casos de empresas controladas no exterior (“offshores”) e introduz de forma inédita legislação sobre os chamados “trusts”.

Também é criada uma janela de transição, com adesão facultativa, em condições específicas de tributação favorecida, para o contribuinte atualizar o valor de bens e direitos mantidos fora do Brasil e se adequar às novas normas.

A medida é vista nos bastidores como uma espécie de “ensaio” para a segunda etapa da reforma tributária planejada pelo governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), focada nos impostos sobre a renda, que deve sair do papel logo após a discussão sobre a reforma que trata da tributação sobre o consumo pelo Congresso Nacional.

É importante destacar que a proposição trata apenas da tributação da renda auferida por pessoas físicas em aplicações financeiras, entidades controladas e trusts no exterior e não afeta investimentos em território nacional nem aplicações de pessoas jurídicas brasileiras em outros países.

Investimentos diretos de pessoas físicas

Atualmente, os rendimentos auferidos por investimentos feitos diretamente pelas pessoas físicas no exterior podem ser tributados como rendimento ou como ganho de capital. No primeiro caso, estão enquadrados os ganhos recorrentes na forma de renda, como dividendos, aluguéis de imóveis, juros e cupons.

A tributação, nesta categoria, se dá pela tabela progressiva do Imposto de Renda – a mesma que incide sobre salários. Até 30 de abril, a tabela fixava na faixa de isenção ganhos mensais de até R$ 1.903,98 e a alíquota máxima, de 27,5%, incidia sobre os valores que ultrapassassem R$ 4.664,68. Com a MPV, a isenção subiu para R$ 2.112,00 e as demais faixas foram mantidas.

O cálculo do IR devido pode ser feito no programa Carnê-Leão, e os rendimentos estão sujeitos ao ajuste anual, com possíveis deduções legais ou soma a outros rendimentos com tratamento de natureza similar dado pela legislação – o que pode elevar os valores devidos.

Já no caso de ganhos de capital com venda, resgate ou liquidação de ativos, como vendas de ações e imóveis ou resgates de cotas de fundos, aplica-se uma tributação exclusiva/definitiva separada, seguindo uma tabela que vai de 15% (para ganhos até R$ 5 milhões) a 22,5% (para o valor que superar R$ 30 milhões). O DARF, nesta situação, é gerado pelo programa GCAP.

Para esta categoria de rendimento, há um limite de isenção do IR para os chamados bens e direitos de pequeno valor. Este montante é de R$ 20 mil para alienação de ações negociadas no mercado de balcão e de R$ 35 mil nas demais situações.

Nas duas situações, o IR é calculado e pago apenas no momento da efetiva realização do ganho. É o chamado regime de caixa. O recolhimento é feito a cada mês em que houver percepção dos ganhos pelo contribuinte, ativo por ativo.

Hoje, o sistema tributário nacional também prevê possibilidade de compensação do imposto já pago no exterior, desde que o país onde foi feito o investimento tenha acordo de não bitributação com o Brasil.

O governo alega que as regras até hoje usadas para tributação de investimentos no exterior haviam sido “emprestadas” de outras situações e geravam insegurança jurídica. Com o argumento de simplificar o sistema, o projeto aprovado unifica as tabelas de cobrança de Imposto de Renda para tudo que classifica como aplicação financeira.

Neste caso, todos os rendimentos do capital aplicado no exterior apurados no ano ficam sujeitos a uma alíquota de 15%, sem possibilidade de dedução da base de cálculo. A versão inicial do texto previa três faixas (de 0% a 22,5%, dependendo do valor nominal do rendimento), mas foi modificada durante a tramitação no Congresso Nacional.

No caso de investimentos em aplicações financeiras no exterior feitas diretamente pela pessoa física, os rendimentos passarão a ser computados uma única vez a cada exercício, e não mais mensalmente, na Declaração de Ajuste Anual (DAA) e submetidos à incidência de IRPF somente no período de apuração em que forem efetivamente percebidos no resgate, na amortização, na alienação, no vencimento ou na liquidação das aplicações (regime de caixa).

Vale destacar que as alterações previstas somente entrarão em vigor a partir de 2024. O projeto estipula que haverá tributação, pela mesma alíquota, da variação cambial de moeda estrangeira em espécie mantida no exterior no que superar o montante de 5 mil dólares (cerca de R$ 25 mil) quando de sua venda a cada ano-calendário.

Assim, a variação cambial é considerada um tipo de rendimento do valor retido em moeda estrangeira. Os valores de depósitos em conta corrente ou em cartão de débito ou crédito no exterior não sofrerão tributação, desde que não sejam remunerados e sejam mantidos em instituição financeira no exterior, conhecida e autorizada a funcionar pela autoridade monetária do país em que estiver situada.

Pelo texto, todos os rendimentos das aplicações no exterior enquadradas serão computados na Declaração de Ajuste Anual (DAA) e submetidos à incidência do IRPF no período de apuração em que forem efetivamente percebidos pela pessoa física. Um campo separado na declaração do IRPF será criado pela Receita Federal para a inclusão das informações exigidas pela nova regra.

O texto apresenta uma lista não taxativa de modalidades consideradas aplicações financeiras sujeitas à regra. São elas: depósitos bancários, certificados de depósitos remunerados, ativos virtuais, carteiras digitais ou contas-correntes com rendimentos, cotas de fundos de investimento (com exceção daqueles tratados como entidades controladas no exterior), instrumentos financeiros, apólices de seguro ( cujo principal e cujos rendimentos sejam resgatáveis pelo segurado ou pelos seus beneficiários), certificados de investimento ou operações de capitalização, fundos de aposentadoria ou pensão, títulos de renda fixa e de renda variável, operações de crédito (inclusive mútuo de recursos financeiros, em que o devedor seja residente ou domiciliado no exterior), derivativos e participações societárias (exceto as tratadas como entidades controladas no exterior).

E classifica como rendimentos os seguintes itens: remuneração produzida pelas aplicações financeiras, incluindo, exemplificativamente, variação cambial da moeda estrangeira ou da criptomoeda frente à moeda nacional, rendimentos em depósitos em carteiras digitais ou contas-correntes remuneradas, juros, prêmios, comissões, ágio, deságio, participações nos lucros, dividendos e ganhos em negociações no mercado secundário, incluindo ganhos na venda de ações das entidades não controladas em bolsa de valores no exterior.

No caso dos ativos virtuais e de carteiras digitais como aplicações financeiras no exterior, o texto prevê regulamentação específica por responsabilidade da Secretaria Especial da Receita Federal do Ministério da Fazenda.

Um ponto incluído durante a tramitação no Congresso Nacional foi a possibilidade de compensação de tributação em casos de imposto sobre a renda pago no país de origem dos rendimentos, desde que essa regra esteja prevista em acordo ou convenção internacional firmados com o país de origem ou haja reciprocidade de tratamento. Mas a dedução não poderá exceder à diferença entre o IRPF calculado com a inclusão do respectivo rendimento e o IRPF devido sem a sua inclusão.

Investimentos por controladas (“offshores”)

Atualmente, os lucros das controladas no exterior estão sujeitos à tributação apenas no momento da efetiva distribuição para a pessoa física, no chamado regime de caixa. Isso permite o diferimento de imposto por tempo indeterminado, gerando vantagem competitiva em relação a outras modalidades.

A maior parte dos especialistas em direito tributário entende, hoje, que a distribuição do lucro das offshores fica sujeita à tributação da pessoa física titular de acordo com a tabela progressiva do Imposto de Renda, que vai de 0% a 27,5%.

Na avaliação de integrantes do governo, contudo, trata-se de uma aplicação de regra criada para outros propósitos e que gerava distorções e insegurança jurídica.

O projeto aprovado, primeiro, busca delimitar o objeto, ao classificar como controladas as sociedades e as demais entidades, personificadas ou não, incluindo fundos de investimento e fundações, em que a pessoa física detiver, de forma direta ou indireta, isoladamente ou em conjunto com outras partes (inclusive em função da existência de acordos de votos), direitos que lhe assegurem preponderância nas deliberações sociais ou poder de eleger ou destituir a maioria dos seus administradores.

Também há identificação de controladas em casos em que a pessoa física possua, direta ou indiretamente, isoladamente ou em conjunto com pessoas vinculadas, mais de 50% de participação no capital social, ou equivalente, ou nos direitos à percepção de seus lucros, ou ao recebimento de seus ativos na hipótese de sua liquidação.

O texto introduz uma regra de tributação periódica dos lucros, conforme a lógica do chamado “regime de competência”, que já existe para investimentos feitos por empresas brasileiras controladas no exterior.

O governo alega que o Brasil é um dos únicos países no mundo em que ainda é permitida a utilização de estruturas “offshores” por pessoas físicas para diferir indefinidamente o pagamento do tributo – prática que provoca quebra de isonomia tributária e prejudica a capacidade arrecadatória do Estado.

O Ministério da Fazenda alega que “as offshores em paraísos fiscais ou em países que possuem regimes fiscais privilegiados (isto é, de baixa ou nula tributação) são utilizadas com frequência por contribuintes de altíssima renda que visam investir no exterior”.

Essa estrutura permite que os contribuintes, normalmente de alta renda, posterguem por um longo período o imposto que deveria ser pago no Brasil, transmitindo o diferimento até mesmo para herdeiros, na sucessão.

“A legislação antiga induzia a fazer [investimentos no exterior] via offshore, já que na pessoa física o tratamento tributário era ruim. Na offshore, havia a consolidação de ganhos e perdas e o diferimento. Então, qualquer um que tivesse mais do que algumas centenas de milhares de dólares já pagava uma offshore”, diz Daniel Loria, diretor no Ministério da Fazenda.

Pela nova regra, os lucros apurados pelas entidades passariam a ser tributados em 31 de dezembro de cada ano, independentemente se foram ou não distribuídos ao titular, seguindo a mesma regra de tributação que as pessoas físicas (alíquota padrão de 15%).

A mudança só produz efeitos sobre resultados apurados a partir de 1º de janeiro de 2024. Resultados acumulados pelas entidades no exterior até 31 de dezembro de 2023, antes da vigência da nova regra de tributação, poderão ser mantidas sobre a regra de incidência momento da efetiva liberação para a pessoa física − a menos que o contribuinte opte pela atualização dos valores (saiba os detalhes abaixo).

A aplicação da regra depende de dois critérios gerais:

1) a entidade deve estar constituída em jurisdição de tributação favorecida, conforme previsto na legislação, ou em paraíso fiscal; ou

2) sociedades no exterior com renda ativa própria inferior a 60% da renda total. Controladas que não se enquadrem nesses itens não estariam sujeitas às novas regras.

O texto classifica renda ativa própria aquela obtida diretamente pela pessoa jurídica mediante a exploração de atividade econômica própria, excluídas as receitas decorrentes, exclusivamente de royalties, juros, dividendos, participações societárias, aluguéis, ganhos de capital (exceto na alienação de participações societárias ou ativos de caráter permanente adquiridos há mais de dois anos), aplicações financeiras e intermediação financeira.

Ele também avança sobre a classificação dos lucros sujeitos a tributação ao apontar para valores disponibilizados no pagamento, no crédito, na entrega, no emprego ou na remessa dos lucros ou quaisquer operações de crédito realizadas com a pessoa física, ou com pessoa a ela vinculada, caso a credora possua lucros ou reservas de lucros.

No caso de a distribuição de lucros das controladas que já tenham sido tributadas na forma para pessoa física controladora, deverão ser indicados na DAA a controlada e o ano de origem dos lucros distribuídos, os quais deverão reduzir o custo de aquisição do crédito do dividendo a receber, pelo valor originalmente declarado em moeda nacional, evitando, assim, dupla tributação.

Pelo texto, poderão ser deduzidos do lucro da pessoa jurídica controlada, direta ou indireta, a parcela correspondente aos lucros e aos dividendos de suas investidas que forem domiciliadas no País e os rendimentos e os ganhos de capital dos demais investimentos feitos no País, desde que sejam tributados pelo Imposto sobre a Renda Retido na Fonte (IRRF) à alíquota igual ou superior a 15%.

E poderão ser deduzidos do lucro da controlada, direta ou indireta, os prejuízos apurados em balanço, desde que sejam referentes a períodos a partir de 1º de janeiro de 2024 e anteriores à data da apuração dos lucros.

Após rodadas intensas de diálogo com agentes econômicos e integrantes do mundo político, o governo também implementou mudanças no texto encaminhado. Uma delas envolve a presença de ativos ilíquidos na carteira de “offshores” mantidas por brasileiros, como uma aplicação em startup ou fundo de venture capital – ativos que não têm mercado secundário.

Dada a dificuldade de avaliação desses ativos a valor justo, a equipe econômica atendeu um pedido para que se oferecesse uma opção de uso da apuração pelo regime de caixa em vez do de competência, que exigiria a o recolhimento periódico de tributos sobre os supostos ganhos com os investimentos mesmo antes do resgate ‒ o que poderia implicar em distorções no caso de ativos sem liquidez.

Entretanto, a opção, a ser exercida em relação a cada entidade separadamente (se tiver mais de uma empresa controlada), será irrevogável durante todo o prazo em que a pessoa física detiver a entidade no exterior.

Os rendimentos obtidos com os bens declarados dessa maneira sofrerão a incidência das mesmas alíquotas previstas no projeto para a distribuição dos lucros da controlada.

Caso o interessado transfira qualquer desses bens a outra entidade controlada para a qual não tenha sido feita a opção citada, eles terão de ser avaliados pelo valor de mercado, e a diferença em relação ao custo de aquisição será considerada renda da pessoa física, tributável segundo a natureza da renda.

Trusts

A proposta também avança sobre a regulamentação dos “trusts”, que são uma ferramenta contratual sofisticada muito utilizada no exterior para a organização do patrimônio e da sucessão por famílias de alta renda. Tal instrumento costuma trazer regras de distribuição do patrimônio, carta de desejos do patriarca ou da matriarca e regras de funcionamento.

A nova regra trata os “trusts” como espécies de entidades transparentes, reconhecidas pela pessoa física. Pelo texto, durante o prazo de vigência dessas estruturas, os rendimentos e ganhos de capital relativos aos bens e direitos objeto dele deverão ser tributados pela pessoa que for considerada como titular na data do fato gerador. A norma inclui entidades controladas detidas pelo “trust”, consideradas detidas pela pessoa física definida como titular, e estarão sujeitas às regras gerais para esse instrumento.

A transferência de titularidade do “trust” ao beneficiário ocorrerá no momento efetivo de sua distribuição por algum mecanismo previsto no contrato ou no falecimento do instituidor, o que ocorrer primeiro. Pelo projeto, a transmissão poderá ser reputada ocorrida em momento anterior caso o instituidor abdique, em caráter irrevogável, do direito sobre parcela do patrimônio do “trust”.

Os bens e direitos objeto do “trust”, independentemente da data da sua aquisição, deverão, a partir de 1º de janeiro de 2024, em relação à data-base de 31 de dezembro de 2023, ser declarados diretamente pelo titular na Declaração de Ajuste Anual, pelo custo de aquisição. O texto abre, ainda, uma possibilidade para, caso a pessoa que tenha informado anteriormente o “trust” em sua DAA seja distinta do titular nos termos da MPV, o declarante poder excepcionalmente seguir considerado o titular para efeitos do IRPF.

Pela nova regra, a distribuição pelo “trust” ao beneficiário, a partir de 1º de janeiro de 2024, possuirá natureza jurídica de transmissão a título gratuito pelo instituidor para o beneficiário, consistindo em doação, se ocorrida durante a vida do instituidor, ou transmissão causa mortis, se decorrente do falecimento do instituidor.

De modo a atacar o problema dos “trusts” irrevogáveis em que a transmissão ainda não ocorreu, e, portanto, nenhuma das partes tem acesso aos recursos, o projeto traz dispositivo que prevê que o instituidor, caso esteja vivo, ou os beneficiários, se tiverem conhecimento do “trust”, deverão providenciar, no prazo de até 180 dias (contados a partir da sanção da lei) a alteração da escritura do “trust” ou da respectiva carta de desejos, para fazer constar redação que obrigue, de forma irrevogável e irretratável, o atendimento, por parte do trustee, das novas obrigações tributárias.

Atualização do valor de bens e direitos no exterior

O projeto aprovado também traz a opção para o contribuinte atualizar o valor dos seus bens e direitos no exterior para o valor de mercado em 31 de dezembro de 2023, tributando a diferença para o custo de aquisição (ganho de capital) pela alíquota definitiva de 8%.

A alíquota menor se justifica porque, se a atualização não for feita, o contribuinte pagará o imposto somente quando a renda for efetivamente disponibilizada ao Brasil, segundo a regra geral anterior às mudanças, resultado em diferimento.

O contribuinte que optar por não aderir à condição para atualização do valor de bens e direitos no exterior também deverá se atentar a segregar nos balanços futuros o que está sujeito às regras antigas e a parte que passará a respeitar as novas normas.

A atualização de bens e direitos no exterior já foi proposta durante o governo de Jair Bolsonaro (PL) na tentativa de reforma do Imposto de Renda encaminhada ao Congresso Nacional. Aquele texto previa alíquota de 6%, mas o dispositivo foi retirado da versão aprovada pela Câmara dos Deputados. O projeto de lei, no entanto, segue pendente de análise pelo Senado Federal.

Além das operações já discriminadas, a opção pode ser utilizada em bens imóveis em geral ou ativos que representem direitos sobre bens imóveis; veículos, aeronaves, embarcações e demais bens móveis sujeitos a registro em geral, ainda que em alienação fiduciária; e participações em entidades controladas.

Fundos exclusivos

Atualmente, os rendimentos produzidos por aplicação ou operação financeira de renda fixa ou variável estão sujeitos à incidência do imposto sobre a renda às alíquotas de 22,5% a 15%, decrescentes em função do aumento do prazo da aplicação.

Tal tributação já é considerada definitiva, nas hipóteses de pessoa física residente no País, pessoa jurídica isenta ou optante pelo Simples Nacional; e considerada antecipação do imposto devido no encerramento do período de apuração, no caso de pessoa jurídica tributada com base no lucro real, presumido ou arbitrado.

Para adequar as normas dos fundos fechados ao que já é aplicado no caso dos fundos abertos, o projeto instituiu o chamado “come-cotas” (tributação periódica nos meses de maio e novembro) para o primeiro grupo. As alíquotas variam de 15%, no caso dos fundos de longo prazo, e de 20%, no caso dos fundos de curto prazo, sendo o restante do imposto devido por ocasião do resgate.

Como regra de transição para os fundos exclusivos, o texto prevê que os rendimentos apurados até 31/12/2023 que não estavam sujeitos à tributação periódica serão submetidos em 2024 à tributação segundo regras diferenciadas, admitindo-se o pagamento do imposto em até 24 parcelas.

Ficam de fora da aplicação do “come-cotas” os Fundos de Investimento em Participações (FIP), os Fundos de Investimento em Índice de Mercado (ETF) – exceto aqueles de renda fixa -, os Fundos de Investimento em Ações (FIA) e os Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (FIDC) que sejam enquadrados como entidades de investimento e cumpram requisitos específicos. Este último grupo não estava previsto na versão original da MPV encaminhada pelo governo.

O texto mantém entendimento de entidades de investimentos , os fundos que possuam estrutura de gestão profissional com poderes para tomar decisões de investimento e desinvestimento, com o objetivo de obter retorno por meio de apreciação do capital aplicado, e que atendam aos requisitos estabelecidos pelo Conselho Monetário Nacional (CMN).

Ficam sujeitos a esse regime específico de tributação os referidos fundos que cumpram o requisito mínimo de investirem, no mínimo, 95% de seu patrimônio líquido em FIP, FIA, ETF e FIDC.

São ressalvados do regime geral de tributação os Fundos de Investimento Imobiliário (FII) e os Fundos de Investimento nas Cadeias Produtivas Agroindustriais (Fiagro). Além de investimentos de residentes ou domiciliados no exterior em fundos de investimento em títulos públicos, em FIPs e aos Fundos de Investimento em Empresas Emergentes (FIEE); aos Fundos de Investimento em Participações em Infraestrutura (FIP-IE) e aos Fundos de Investimento em Participação na Produção Econômica Intensiva em Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (FIPPD&I); os Fundos de Investimento com Carteira em Debêntures Incentivadas; os fundos de investimentos com cotistas exclusivamente residentes ou domiciliados no exterior; e ETFs de Renda Fixa.

O texto altera regra para isenção aplicável aos rendimentos distribuídos por FIIs e Fiagros à efetiva negociação das cotas suas cotas em bolsas de valores ou no mercado de balcão organizado e de forma a ampliar o número mínimo de 100 cotistas necessário para enquadramento.

Pela regra, não será concedido o benefício ao conjunto de cotistas pessoas físicas ligadas titulares de cotas que representem 30% ou mais da totalidade das cotas emitidas pelos FIIs ou pelos Fiagro, ou ainda cujas cotas lhes derem direito ao recebimento de rendimento superior a 30% do total de rendimentos auferidos pelo fundo.

O fundo de investimento terá prazo de até 180 dias contado da data da primeira integralização de cotas para se enquadrar no mínimo de 100 cotistas. Caso ele possua quantidade inferior à marca, ele poderá manter o tratamento tributário favorecido desde que retome a quantidade mínima dentro de 30 dias.

(com Agência Câmara e Agência Senado)

Postado em 30 de novembro de 2023