Senado vê interferência do STF e avalia retomar temas julgados pelo tribunal
Após o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco ( PSD -MG), apresentar uma PEC (proposta de emenda à Constituição) para criminalizar qualquer porte ou porte de droga , senadores avaliam mais duas medidas contra temas pautados no STF (Supremo Tribunal Federal): os impostos sindicais e o aborto .
A visão entre líderes do Senado ouvidos pela Folha é que o Supremo tem invadido a competência do Congresso de legislar. E a forma de reagir a isso, para eles, é alterar o texto da Constituição.
Nesse sentido, a primeira ocorrência foi a PEC, apresentada por Pacheco na última quinta-feira (14), para criminalizar a posse e o porte de drogas, independentemente da quantidade ou da substância.
A medida foi protocolada menos de um mês após o Supremo retirar o julgamento da descriminalização do porte de drogas para uso pessoal a partir da interpretação de um artigo da lei 11.343/2006 , a chamada Lei de Drogas. O placar está em 5 a 1 a favor da descriminalização .
“A lei considerará crime a posse e o porte, independentemente da quantidade, de entorpecentes e drogas afins sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar”, diz o texto proposto por Pacheco, que já escreveu artigo para defender que o STF não tem competência para tratar do tema.
O trecho seria acrescido na forma de inciso ao artigo 5º da Constituição .
Senadores e deputados federais protestam contra o julgamento com o argumento de que uma medida deveria ser discutida pelo Congresso, não pelo STF. No início do mês passado, Pacheco disse que as “discussões políticas” deveriam ocorrer em âmbito político .
Outro julgamento que causou transtornos no Senado foi o do imposto sindical.
Na segunda (11) , o STF definiu que os sindicatos poderão cobrar contribuição assistencial de todos os trabalhadores representados por eles, sejam sindicalizados ou não.
Segundo a tese, aprovada por maioria de votos, é permitida a cobrança da contribuição, desde que o trabalhador não sindicalizado tenha o direito de se opor a ela.
O terceiro tema, que ainda não foi tema de decisão do STF, é o aborto.
Na terça (12), a presidente do Supremo, ministra Rosa Weber , liberou para julgar a ação que trata da descriminalização do aborto durante o primeiro trimestre de gestação —ela é a relatora.
A ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) 442, apresentada pelo PSOL em 2017, ainda não tem dados para ser julgada.
A ação questiona a violação dos direitos fundamentais das mulheres diante da manutenção do atual entendimento no país sobre o aborto. A lei brasileira criminaliza o aborto com apenas três abordagens: risco de vida, gravidez resultante de estupro e feto anencéfalo.
Também pede que sejam restaurados a incidência de artigos do Código Penal sobre a interrupção voluntária e voluntária da gestação nas primeiras 12 semanas.
Na visão dos senadores, esse tipo de assunto é legislativo e, portanto, deveria ser tratado pelo Congresso.
Os três temas são discutidos pelas lideranças nos corredores e também nas reuniões semanais, que definem as pautas que serão votadas pelo Senado.
Foi em um desses encontros, na semana passada, em que foi batido o martelo sobre a PEC antidrogas, que acabou anunciada por Pacheco logo após o fim da reunião.
Segundo apresenta, a Casa ainda estuda como se posicionar diante dos outros dois assuntos.
Especificamente sobre o aborto, a tendência, na visão dos parlamentares, é que a PEC seja mais conservadora que a decisão do STF, em razão da composição do colégio de líderes —a reunião costuma ser amplamente composta por homens.
“Esses temas são muito caros aqui e a tendência é fazer algo parecido [com o caso das drogas]”, afirmou Izalci Lucas (PSDB-DF). “Não tenho dúvidas de que a questão do imposto e do aborto, a depender do que o Supremo definir, serão questionadas.”
Ele afirma que o debate no Legislativo, além de estar previsto na divisão de competência dos Poderes, também dá mais segurança jurídica às decisões sobre esses temas.
“Então a gente precisa restabelecer essa segurança [jurídica], com os limites de cada Poder, e para isso temos a Constituição, e cabe ao Supremo cuidar dela”, afirma.
Segundo Pacheco, no dia da apresentação da PEC antidrogas, a única ressalva para a proibição deve ser o uso de substância para uso medicinal (como a cannabis medicinal). No dia, ele também ressaltou que o tema deveria ser regulamentado pelo Legislativo.
O presidente do Senado afirmou que a avaliação dos líderes da Casa é de que uma política antidrogas no país deve ser “rígida”.
“O entendimento do Senado não faz sentido de que a política antidrogas deve envolver a recriminação do tráfico ilícito de entorpecentes com veemência. E que a descriminalização do porte para uso, de maconha ou qualquer outra droga, sem uma política pública discutida no Congresso, é uma decisão isolada que diz respeito ao combate ao tráfico de drogas”, disse, na última quinta, após uma reunião semanal com as lideranças dos partidos.
Ministros e especialistas que defendem a definição de critérios objetivos para a distinção entre usuários e traficantes argumentam que o modelo atual penaliza mais pessoas negras e pobres .
Folha de SP