Supergonorreia: o que se sabe sobre a infecção resistente aos antibióticos.
A gonorreia, causada pela bactéria Neisseria gonorrhoeae, é a segunda infecção sexualmente transmissível (IST) bacteriana mais comum. A transmissão acontece por sexo vaginal, anal ou oral desprotegido com alguém que tenha gonorreia ou de mãe para filho durante o parto. O uso correto e consistente de preservativos diminui significativamente o risco de transmissão sexual.
De todas as ISTs, a gonorreia é a mais resistente a antibióticos. O aumento da resistência à maioria dos antibióticos usados para tratar infecções gonocócicas foi relatado em todo o mundo, levantando preocupações sobre o eventual desenvolvimento de infecções intratáveis com sérias consequências para a saúde sexual e reprodutiva.
Nesta semana, foram registrados os primeiros casos de gonorreia resistente nos Estados Unidos. Embora esteja sendo chamada popularmente de “supergonorreia”, não se trata de um nova doença.
“As infecções pelo gonococo, popularmente chamada de gonorreia, que podem acometer tanto pessoas do sexo masculino como do feminino, nunca deixaram de acontecer. A gonorreia pode ser transmitida durante a atividade sexual, considerada uma infecção sexualmente transmissível. Pode acometer a topografia de várias partes do corpo, não só os genitais, mas também outros locais, como as articulações e até a manifestação dentro de órgãos internos, quando há um quadro disseminado”, explica o médico infectologista Álvaro Furtado, do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo (USP).
Fenômeno da resistência bacteriana
A resistência de microrganismos aos antibióticos é uma das maiores ameaças à saúde global atualmente. O aumento no número de bactérias resistentes aos medicamentos, chamadas popularmente de superbactérias, coloca em risco a saúde de humanos e de animais em todo o mundo.
O problema está associado diretamente ao uso excessivo e incorreto dos antibióticos disponíveis. Além disso, contribuem para a resistência fatores como as mutações genéticas presentes no organismo.
A resistência antimicrobiana associada à bactéria causadora da gonorreia, N. gonorrhoeae, apareceu logo após o início do uso de medicamentos antimicrobianos. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), o problema continuou a se expandir nos últimos anos, afetando medicamentos como tetraciclinas, macrolídeos (incluindo azitromicina), sulfonamidas e combinações de trimetoprim e, mais recentemente, quinolonas.
Em muitos países, a resistência à ciprofloxacina é extremamente alta, a resistência à azitromicina está aumentando e a resistência ou diminuição da suscetibilidade à cefixima e à ceftriaxona continuam a surgir (veja estudo abaixo).
A gonorreia com alto nível de resistência ao tratamento atualmente recomendado para gonorreia (ceftriaxona e azitromicina), mas também incluindo resistência à penicilina, sulfonamidas, tetraciclina, fluoroquinolonas e macrolídeos, são chamadas de superbactérias da gonorreia ou supergonorreia.
“A resistência a esse patógeno [agente causador de doença] é o grande problema nesses últimos anos pelo uso indiscriminado de antibióticos. Temos visto nas séries do Brasil, dos Estados Unidos e da Europa um aumento preocupante de resistência a vários antimicrobianos, motivo pelo qual alguns anos atrás a gente mudou a indicação de gonorreia no Brasil, tendo que tratar a gonorreia com medicação injetável, saindo de medicações apenas orais”, afirma Furtado.
Ameaça de gonorreia intratável
O combate à N. gonorrhoeae multirresistente requer duas abordagens: amplo controle da resistência aos medicamentos e controle da gonorreia. Ambos devem ser abordados em contextos mais amplos de controle global da resistência antimicrobiana, de acordo com a OMS.
A diminuição da eficácia dos tratamentos disponíveis contra a bactéria responsável pela doença e a falta de uma vacina para prevenir a infecção levantam preocupações sobre a possibilidade da gonorreia se tornar mais resistente ao tratamento, ou mesmo intratável, no futuro.
É possível surgir um caso de gonorreia que seja completamente intratável. Já apareceram casos, alguns anos atrás, na literatura nos Estados Unidos, com gonococo resistente a ceftriaxona e também até macrolídeos. Ainda temos opções para tratar com drogas de alto espectro, isso nos preocupa, por que se usar um antibiótico de alto espectro para o tratamento uma infecção relativamente simples é preocupante. Se começarmos a ter resistência a esses antibióticos de alto espectro, existe a possibilidade sim de termos uma resistência total ou dificilmente tratável
Álvaro Furtado, médico infectologista
A gonorreia é uma infecção sexualmente transmissível (IST) que, se não tratada, pode levar a sérios problemas de saúde, incluindo infertilidade em mulheres, transmissão da doença para bebês recém-nascidos e aumento do risco de HIV.
CNN