Fim da exigência de autoescolas vai gerar demissões em massa no RN, afirma setor

A decisão do Governo Federal de acabar com a obrigatoriedade dos cursos de formação em autoescolas para obtenção da Carteira Nacional de Habilitação (CNH) representa, na avaliação do setor, o colapso de um mercado inteiro. A mudança, que acaba com a exigência de aulas práticas e transfere a parte teórica para uma plataforma digital do governo, provoca o que empresários classificam como uma “nova pandemia” entre os Centros de Formação de Condutores (CFCs).
A previsão do setor é de demissões em massa, fechamento de empresas e desestruturação de toda a cadeia econômica que orbita em torno da formação de motoristas.
Presidente do Sindicato dos Centros de Formação de Condutores do Rio Grande do Norte (SindCFC-RN), Eduardo Domingo afirma que os impactos começaram antes mesmo de a decisão ser oficializada pelo Conselho Nacional de Trânsito (Contran) – o que aconteceu na última segunda-feira 1º, por unanimidade.
“Já impactou. Desde julho, quando o ministro dos Transportes, Renan Filho, começou a divulgar que poderia fazer essa modificação, o movimento das autoescolas caiu 80%, 70%”, afirmou Eduardo, em entrevista à rádio Jovem Pan News Natal nesta terça-feira 2. “Eu vou te dizer: a gente vem vivendo uma nova pandemia no setor.”
De acordo com Eduardo Domingo, o setor perdeu alunos, faturamento, previsibilidade e segurança jurídica. Para ele, houve uma exposição precipitada, sem diálogo e com graves consequências. Na avaliação do dirigente, a estratégia deixou as empresas em completo abandono. “Ele botou as autoescolas à deriva”, afirmou o empresário, em referência a Renan Filho.
O cenário projetado é de colapso em escala nacional. Segundo Eduardo Domingo, o País possui cerca de 15 mil autoescolas. Caso a resolução seja mantida, esse número não deve resistir. “Não fica mil”, afirmou.
No Rio Grande do Norte, o impacto também será devastador. “Aqui no Rio Grande do Norte são 120 autoescolas. Se ficar 30, é muito”, projetou.
O presidente do sindicato descreve o futuro do setor como uma sequência de fechamentos inevitáveis: “Não pense que a qualquer momento uma autoescola vai fechar a porta e não vai abrir mais porque o proprietário é velhaco ou é trambiqueiro. É porque não se tem mais dinheiro.”
“O governo nos matou em pedaço, como quando tem diabetes. Te comeu um dedo, te comeu o pé, te comeu a perna, te cegou. Isso foi o que o ministro Renan Filho fez. Desde julho ele vem fazendo isso.”
O impacto mais imediato será no emprego. O sindicato estima que cada autoescola emprega, em média, dez trabalhadores. O fechamento das empresas provoca um efeito direto na renda de milhares de famílias. “No RN, somos 120 autoescolas. Se a gente botar aí dez colaboradores por autoescola, nós vamos a 1.200 trabalhadores”, explicou.
A projeção é dramática: “Desses, 950 nós vamos demitir.” Ou seja, quase 80% dos empregos diretos do setor estariam condenados.
O impacto não se limita aos instrutores e funcionários administrativos. A cadeia vai além: despachantes, psicólogos, clínicas médicas, oficinas, empresas terceirizadas de prova prática, fornecedores, gráficas e profissionais de tecnologia também devem sofrer. Trata-se, segundo a entidade, de um desmonte completo de uma estrutura que levou décadas para ser construída.
Para Eduardo, a justificativa de que a CNH é cara não se sustenta. “A habilitação não é um documento, que nem uma carteira de identidade. A habilitação é uma profissão.” Ele compara o custo da CNH com cursos superiores: “Um curso de jornalismo custa seis, sete mil reais. Uma habilitação custa dois mil.”
E questiona: “Como é que eles dizem que não têm dinheiro para habilitação, mas têm pra comprar moto, carro e iPhone?” Segundo ele, o investimento retorna rapidamente: “Dois meses, três meses com aplicativo, e já recupera. Um curso superior leva anos.”
Para o sindicato, o sistema público não tem estrutura para absorver o aumento de candidatos fora das autoescolas. “O Detran não tem vaga. Hoje tu termina as 20 aulas e só faz o exame em março.”
Com a nova regra, Eduardo alerta: “A enxurrada de alunos vai triplicar. Não tem como absorver.”
Medida também vai provocar retrocesso no trânsito, aponta empresário
Eduardo Domingo critica a mudança por considerar que o Brasil está voltando a um modelo ultrapassado e perigoso. “Trazer isso de volta dos anos 1980 para agora em 2025 é um retrocesso.”
A nova regra reduz as aulas práticas obrigatórias de 20 para apenas duas horas. Nessas aulas, o aluno poderá usar carro particular e optar por aulas com um instrutor autônomo, credenciado pelo Detran. Já as aulas teóricas deixam de ser presenciais e passam a ser digitais.
Para o presidente do sindicato, não há como garantir qualidade nesse modelo: “No meu ponto de vista, é zero qualidade. Tu não tem como avaliar uma pessoa em duas aulas.” Ele lembra que mesmo com 20 aulas havia risco. “Eu, quando era instrutor, achava que a pessoa não tinha condições, mas eu não podia impedir. Agora imagina com duas”.
Eduardo também relaciona a medida ao agravamento do caos no trânsito e sobrecarga do sistema de saúde. “Quando começar a dar os acidentes, a responsabilidade é dele. Foi ele que criou isso aí”, disse referindo-se ao ministro dos Transportes, principal defensor da medida.
Para ele, o custo da economia na formação será muito maior nos hospitais: “O que o ministro está fazendo de economizar aqui vai gastar muito mais lá no SUS. Podem escrever o que eu estou dizendo.”
Segundo Eduardo, o impacto será inevitável: mais motoristas despreparados, mais vítimas e mais custos.
O dirigente foi enfático ao afirmar que o setor não foi ouvido em nenhum momento. “Não aconteceu diálogo. E isso que é a grande mágoa da categoria.” Ele relata que houve protestos de todo tipo: “A gente foi a Brasília várias vezes, procurou deputados, fez audiência pública, fez carreata, fez paralisação, fez tudo, e o governo nunca nos atendeu.”
A insatisfação também atinge o presidente da República: “O que vier daqui para a frente a culpa é exclusiva do ministro Renan. E do presidente Lula, que abonou ele.”
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