VIVEMOS UM MOMENTO DE LEI DE SELVA NO AMBIENTE VIRTUAL’, DIZ MESSIAS, DA AGU, AO COBRAR REGULAÇÃO DAS REDES APÓS O 8/1
Jorge Messias , advogado-geral da União, argumenta que os ataques de 8 de janeiro reforçaram a necessidade de regularidade das plataformas digitais. Mais um entrevistado na série de conteúdos especiais produzidos pela GLOBO na marca de um ano dos atos antidemocráticos, o conselheiro jurídico do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) também relatou o recebimento de que a investida golpista se espalhousse pelo país. Cotado para o Supremo Tribunal Federal (STF) recentemente, ele defendeu a aproximação do governo com público evangélico.
Como o senhor sabia dos atos golpistas?
A minha filha estava vendendo TV e me avisou da tomada do Congresso. Olhei aquela cena para entender o que estava acontecendo. Acionei a minha equipe da AGU , liguei para Flávio Dino (ministro da Justiça) e falei com o presidente (Lula): “Vamos traçar uma estratégia jurídica de como vamos responder”.
Havia a recepção daquele movimento em Brasília se reproduzido em outros estados.
Teve um pedido para que as forças de segurança de todos os estados fossem colocadas de prontidão.
Como foi construída a ocorrência dos atos?
O presidente me ligou uma ou duas vezes. Ele estava muito indignado. Falei com vários ministros do STF (Supremo Tribunal Federal). Todos ficaram muito perplexos e ajudando na reflexão. Comunicado ao Alexandre (de Moraes) que apresentaria alguns pedidos. A partir dessas conversas, projetamos uma estratégia: pedir a prisão de todos os manifestantes, do comandante da Polícia Militar e do secretário de Segurança Pública do Distrito Federal.
Vídeo: ‘Um dos planos era me prender e forçar após o golpe’, diz Moraes em entrevista um ano depois do 01/08
Por que não foi feito antes de um pedido para a remoção dos acampamentos golpistas?
As pessoas que estiveram à frente desta avaliação, que não eram o advogado-geral da União, não tinham esse entendimento de que tinha acontecido essa ameaça de um movimento ostensivo e agressivo.
Olhando em retrospecto, o governo poderia ter feito algo para evitar os ataques?
É muito fácil ser um engenheiro de obra pronto. A principal mensagem de que eu gostaria de deixar o dia 8 de Janeiro é a necessidade de regulação das redes. Temos que priorizar um marco legal que confira cidadania digital e responsabilização das plataformas.
Hoje você pode fazer qualquer tipo de manifestação golpista nas redes sociais e não há nenhum tipo de filtro.
Vivemos um momento de lei de selva no ambiente virtual.
Qual é a responsabilidade das plataformas no 8 de Janeiro?
Ficou provado depois que esse movimento do dia 8 foi organizado e amplificado a partir das redes sociais.
Sem as redes sociais, não teria sido possível aglutinar essas pessoas todas em Brasília, mobilizar nos quartéis pelo país fora.
A “festa da Selma” (convocação para o dia 8 de Janeiro) foi viabilizada por esse modelo de negócio das plataformas, que não tem um filtro para coibir esse tipo de situação.
Por que a AGU atuou para conter o hackeamento do perfil da primeira-dama, Janja, no X (ex-Twitter)?
Naquele momento atuamos porque o autor da invasão praticou crimes contra o presidente da República. Isso atraiu a nossa competência. Só que a plataforma demorou quase duas horas para interditar o crime. Isso mostra que não tinha nenhum atendimento humanizado. Para quem está sendo violentada, psicológica e politicamente, além de ser alvo de misoginia, duas horas (de hackeamento) é um horror.
Alguns dos presos no 8 de Janeiro disseram que as igrejas evangélicas financiaram a viagem para Brasília. Como o senhor tem atuado para estreitar a relação entre lideranças religiosas e o governo?
Frequento o meio evangélico há 40 anos. Testemunhei toda a ascensão da extrema direita no movimento evangélico nos últimos anos. Sei exatamente o que aconteceu e como algumas pessoas foram capturadas. Até agora, ainda não tive encontro com nenhuma liderança evangélica. Acho que tem que ter. Temos condição, até pelo que o presidente já disse, de ter um momento muito bom de diálogo com o segmento evangélico. A maior preocupação do segmento é com a família, que tem muito a ver com as agendas de segurança e educação.
O seu nome foi cotado para ser ministro do STF. O senhor vê como uma possibilidade futura?
Estou muito focado na minha missão. Eu já disse em algumas oportunidades que o presidente me confiou uma missão que é muito relevante. Não posso ficar especulando sobre aquilo que não existe.
o globo