Convenção republicana reflete culto a Trump; combo de Bíblia e foto pós-atentado é vendido por R$ 410
A convenção republicana reflete o culto a Donald Trump que tomou conta do partido, indissociável hoje da base “Maga”, a sigla em inglês para o slogan “torne a América grande de novo” que batiza os leais apoiadores do empresário.
A imagem do ex-presidente é onipresente: dos outdoors nas vias de acesso ao perímetro de segurança em que ocorre o evento às camisetas, canecas e bonecos vendidos em lojas no Fórum Fiserv e no Centro Baird, em Milwaukee (Wisconsin).
A famosa Bíblia de Trump, uma parceria feita entre o empresário e o cantor country Lee Greenwood, é vendida a US$ 75 (R$ 410) em um combo incluindo um autógrafo do cantor e a já icônica foto do ex-presidente erguendo o punho após a tentativa de assassinato no sábado (13).
O rol de produtos que fazem referência ao empresário é amplo: ursinhos, brincos, broches, bonés, velas, adesivos. Muitos estampam a foto de Trump após ser fichado na Geórgia, parte do processo criminal em que é acusado de tentar reverter a derrota na eleição de 2020. Há itens ligados apenas ao partido, como o elefante que o simboliza, mas em quantidade muito menor.
A reportagem tentou falar com a atendente da loja, localizada no Centro Baird, que concentra a imprensa, mas ela pediu para ser procurada mais tarde porque estava atolada de trabalho –de fato, o caixa nunca dava um respiro.
Uma outra banca de produtos vendia, além de produtos pró-Trump, itens anti-Joe Biden, como um adesivo “hora de ir embora” com a imagem do presidente ao fundo e outro se referindo à primeira-dama, Jill, com um insulto machista.
No meio da pilha, havia ainda um adesivo com a frase “minha governadora é uma idiota”, com uma imagem de Gretchen Whitmer –que governa o vizinho Michigan e é uma das cotadas para substituir Biden na chapa democrata caso ele ceda à pressão e se retire da corrida.
Um outro estande a poucos metros vende um livro de poesias de Trump –na verdade, tuítes do ex-presidente impressos como se fossem poemas construtivistas, explica Gregory Woodman. “Cada um custa US$ 45 [R$ 240], em homenagem ao 45º presidente dos EUA”, completa.
O primeiro volume da obra foi lançado em 2019 e já está esgotado. Goodman está na convenção recebendo encomendas para o segundo volume, que será lançado no próximo semestre. Goodman não usa números precisos, diz que foram centenas de livros vendidos.
Ele também coleta assinaturas para nomear o empresário como poeta laureado dos EUA 2024-2025.
Mas o itens mais quente do momento é a camiseta com a foto de Trump após sobreviver ao atentado há quatro dias, ao lado da palavra “lute! Lute! Lute!”. Um estande entre o centro Baird e o Fórum Fiserv conseguiu oferecer o produto, pedido desde segunda pela clientela, nesta quarta, diz Anthony Montgomery.
O modelo custa US$ 50 (R$ 274), US$ 20 mais caro do que os demais. São apenas 60 à venda, e o tamanho extra-grande foi o primeiro a esgotar, diz o vendedor.
Montgomery disse que faturou cerca de US$ 4.000 no primeiro dia, mas acredita que o valor dobrou no segundo. Nesta quarta, ele afirma que deve faturar o mesmo da véspera.
Entre o Centro Baird e o Fórum Fiserv, há uma espécie de feira: duas fileiras de tendinhas brancas vendem de comida a produtos diversos, como cosméticos naturais e quadros para pendurar na parede.
Um desses estandes se destaca com um display de um homem musculoso segurando uma arma, uma figura que lembra o Rambo. O rosto, no entanto, foi substituído pelo o de Trump, usando uma faixa na cabeça.
O marketing pertence à “Patriot Mobile” (operadora patriota), uma operadora de celular que se vende como “a primeira operadora cristão dos EUA”. Os planos variam US$ 26 a US$ 78.
Segundo o vendedor da empresa, que não quis dar o nome e nem ser gravado, o diferencial da companhia em relação às operadoras que dominam o mercado nos EUA é para onde vai o dinheiro. Ele diz que uma parte do que é faturado é direcionado para organizações pró-vida, como são chamadas entidades contrários ao aborto, que defendem a primeira e segunda emenda da Constituição —referências à liberdade de expressão e armas— e veteranos de guerra.
Muitas pessoas vestem chapéus de cowboy, botinas, roupas cintilantes com as cores dos EUA e muito, muito vermelho —a cor do partido. Nesse mar patriota, destaca-se o homem famoso por usar um terno estampado por tijolos marrons, em referência ao muro com o México, bandeira de Trump em 2016, figura já carimbada em eventos do ex-presidente.
Mas não se trata apenas de uma questão de imagem. Todo o conteúdo da convenção e seus convidados —e ausências– refletem o domínio de Trump sobre um partido cujo establishment, a princípio, o rejeitava.
Cada um dos quatro dias de evento é voltado para um eixo da campanha. Na segunda, o tema foi “torne a América rica de novo”, voltado à economia; na terça, “segura de novo”, tratando de imigração e criminalidade; nesta quarta, será “forte de novo”, com foco na política exterior; e, finalmente, na quinta (18), “torne a América ótima de novo”, que culmina com o discurso de Trump de aceitação da nomeação.
“Eu acho que Trump transformou nosso partido no que ele sempre deveria ter sido, um partido populista enraizado em princípios conservadores”, disse o deputado Jim Jordan ao site Politico.
Nomes tradicionais republicanos parecem discordar dessa guinada. Não participam da convenção, por exemplo, Milke Pence, que foi vice de Trump e rompeu relações com o empresário após o fim do mandato; o vice de George W. Bush, Dick Cheney, e sua filha, Liz, uma feroz crítica de Trump, e o senador Mitt Romney, candidato do partido à Casa Branca em 2012 derrotado por Barack Obama.
O senador Mitch McConnell, um dos poucos grandes nomes do establishment que participam do evento, acabou sendo vaiado quando pegou o microfone para anunciar o apoio dos delegados de seu estado, o Kentucky, a Trump.
Folha de São Paulo